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Brasil e mundo

Petrobras: 1953, 68 anos depois. Por Mateus Bandeira

“Presidente Bolsonaro, a condição histórica para abolir o monopólio da Petrobras, 68 anos depois da criação da estatal, está posta. Crie as condições políticas. Abra o debate, presidente. Vamos ver quantos se incomodam”

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Parodiando uma brincadeira de criança, poderíamos dizer que um preço de combustível incomoda muita gente, dois preços de combustível incomodam muito mais.

Já em 1930, o Conselho Nacional do Petróleo, enquanto examinava as solicitações de pesquisa e exploração do óleo em nosso território, trabalhava no regramento de como deveria ser realizada, do ponto de vista legal e dos melhores interesses brasileiros, esta exploração. Após anos de intenso debate, foi criada a monopolista Petrobras, em 1953, pelas mãos do presidente Getúlio Vargas, coroando a exitosa campanha “o petróleo é nosso”.

De lá para cá, mesmo com todas as mudanças na legislação sobre a exploração, distribuição e governança do petróleo e seus derivados, as tentações de intervenção governamental na fixação dos preços dos combustíveis foram invencíveis. Todos os incomodados cederam ao cântico sedutor das sereias ou, simplesmente, não resistiram às múltiplas oportunidades de votos ou negócios, sempre com resultados catastróficos, pelo menos para o Brasil. Somente a política de preços da era Dilma custou R$ 100 bilhões aos bolsos de todos nós.

A tarefa de resistir à tentação parece ser tão grande quanto os 61% de brasileiros que defendem a intervenção presidencial nos preços da gasolina, segundo pesquisa Exame/Ideia publicada em 26 de fevereiro deste ano. O Congresso Nacional, legítimo representante de nossa gente, não deve ter porcentuais de opinião muito diferentes.

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Preço alto: Retração da oferta e câmbio

Agora, neste 2021, quase pós-pandemia, mais uma vez, a gasolina está na casa dos “dois preços”. A lista de fatores concorrentes para isto, internacionais alguns e nacionais outros, é conhecida. Primeiro, a cotação do petróleo vem aumentando desde o início do ano, com o preço do barril ultraando US$ 80 em setembro ado, o maior valor desde outubro de 2018. Esta alta decorre da retração da oferta – ação preventiva de parte dos países produtores (Opep) diante da pandemia –, combinada com um aumento da demanda decorrente da retomada das atividades econômicas em um ritmo superior ao esperado. Depois, o câmbio. Países de moeda fraca, como o caso do Brasil, sofrem duplamente: além do aumento do valor do barril, o dólar também está mais caro. Finalmente, além da paridade de preço de importação – medida acertada e necessária em função de nossa insuficiente capacidade de refino (quem iria importar gasolina com o preço interno artificialmente abaixo do mercado internacional? A consequência seria o desabastecimento); a elevação dos custos dos biocombustíveis – que entram na composição da gasolina e do diesel –; e, claro, nossos impostos, notadamente o ICMS, este insidioso vilão estadual, responsável, em muitos casos, por um terço do preço final do combustível.

Nesta análise simples da complexa cadeia de formação dos preços dos combustíveis, e da gasolina em particular, cabe uma notinha informativa: o Brasil ocupava, em 2020, em valores absolutos, a 35.ª posição no valor do litro da gasolina entre 61 países e, em valores relativos ao gasto em relação à renda média, éramos o 11º colocado.

O resultado da gasolina com preços nas alturas? Muita gente incomodada. Entre elas, o presidente Jair Bolsonaro. Constrangido pelas circunstâncias que o deixam com o ônus político dos aumentos de preço da gasolina, óleo diesel e gás, ele concedeu uma instigante entrevista à rádio Novas de Paz, de Pernambuco, no dia 14 deste mês: “Aumentou a gasolina, culpa do Bolsonaro. Eu tenho vontade, eu já tenho vontade de privatizar a Petrobras. Tenho vontade. Vou ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer. Porque, o que acontece… Eu não posso… não é controlar, eu não posso melhor direcionar o preço do combustível. Mas quando aumenta a culpa é minha. Aumenta o gás de cozinha, a culpa é minha; apesar de ter zerado o imposto federal – coisa que não acontece aí, por parte de muitos governadores. Reconheço que os governadores não podem zerar o ICMS. Mas a cobrança do ICMS não pode ser feita em um percentual em cima do preço final da bomba”.

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Podemos sonhar?

Não chegou a ser uma proposta de privatizar a Petrobras. Talvez tenha sido uma queixa, talvez uma simples reflexão. Não me pareceu uma ameaça. Entretanto, diferentemente de outras falas presidenciais – propostas, comentários, simples piadas ou mesmo soluços –, esta declaração não mereceu, por parte de nenhum setor, uma condenação apocalíptica. Podemos sonhar?

No momento em que o Brasil busca recuperar a plenitude de suas atividades socioeconômicas, e quando as pautas para o ano eleitoral começam a ganhar clareza, quem sabe a proposta de privatizar a Petrobras não escapa de uma quase queixa presidencial e ganha contornos de seriedade? Qual seria o impacto de transformar a secretaria hoje encarregada de privatizar órgãos e companhias menos representativas em uma Secretaria de Privatização da Petrobras? E do Banco do Brasil? Qual seria a repercussão junto a investidores? O que perderíamos dos pontos de vista econômico ou estratégico? E no plano político-eleitoral, conseguiríamos eleger uma bancada com estes compromissos? Um dia estas propostas não elegeriam quase ninguém. E nos dias atuais?

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O ex-senador Roberto Campos, entrevistado pelo jornalista Fernando Rodrigues, na Folha de S.Paulo, em 11 de outubro de 2001, respondeu assim à pergunta se ele teria tido poder, ou condições, para abolir o monopólio (então vigente) do petróleo: “Esta é que é a história. Eu propus para o presidente Castello Branco e ele achava que não havia condições históricas. Ele concordava com a tese, mas não tinha condições políticas para implementar”. Presidente Bolsonaro, a condição histórica, 68 anos depois da criação da Petrobras, está posta. Crie as condições políticas. Abra o debate, presidente. Vamos ver quantos se incomodam.

* Mateus Bandeira, conselheiro de istração e consultor de empresas, foi CEO da Falconi, presidente do Banrisul e secretário de Planejamento do Rio Grande do Sul.

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A liberdade sagrada das redes

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Noutro dia escrevi um texto sobre a cisão no vínculo entre as pessoas e o meio em que vivem, responsabilizando parcialmente as novas tecnologias de comunicação. Disse: “Se por um lado as tecnologias deram voz à sociedade, por outro, nos têm distraído da concretude do mundo, de interação mais hostil, levando-nos a viver em mundos paralelos”. E: “No mundo moderno, não habitamos mais exatamente nas cidades, mas sim no mundo virtual, um refúgio, retroalimentado pelo algoritmo, onde não há frustrações, mas sim gratificações instantâneas”. Bem, esse é um lado da questão. E não é novo.

Desde Freud se sabe que, diante do trauma, a criança dissocia-se para á-lo, refugiando-se na neurose, uma estratégia de defesa contra o trauma. Pois, assim como a criança traumatizada, as pessoas, diante das escalabrosidades do mundo concreto, fazem igual: elas se refugiam no mundo virtual, guardando, do mundo concreto, uma distância.

O outro lado da questão, o reverso da moeda, é que, sem as novas tecnologias de comunicação, a voz traumatizada da sociedade permaneceria atravessada na garganta, sem chance de extravasar-se.

A possibilidade de expressão liberou uma carga de justos ressentimentos contra os limites da política, as injustiças, o teatro social. De súbito, tivemos uma ideia do tamanho da insatisfação com os sistemas de vida, ando publicamente a protestar, em alguns casos chegando à revolução, como ocorreu na Primavera Árabe, onde as redes sociais cumpriram um papel fundamental.

Pois não é por outra razão que os donos do antigo mundo estão incomodados e querem controlar a liberdade de expressão, especialmente a velha imprensa, os monopólios empresariais, os sistemas políticos totalitários. Enfim, todos aqueles para quem a internet e as redes sociais ameaçam seu poder, ao por de pernas pro ar as certezas convenientes sobre as quais se assentaram.

Fato. As inovações desarranjam os mercados e os modos de vida. Toda inovação faz isso. É o preço do progresso. Mas, assim como é impossível voltar ao tempo do telégrafo (imagine o desespero nas Bolsas de Valores), é impensável retroagir ao mundo exclusivo da prensa de Gutenberg. Porque as descobertas, afinal, permitem avançar nos arranjos produtivos: propiciam economia de tempo, dinheiro e, no caso da comunicação, ampliam a liberdade, seu bem mais precioso.

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Com todos os defeitos que a vida tem, é preferível mil vezes, ao controle da palavra, a liberdade de dizê-la. Quem pode afirmar (ou julgar) o que é verdadeiro e o que é falso, senão as pessoas mesmas, em última análise, de acordo com suas percepções e as pedras em seus sapatos? Pois hoje, depois de provarmos a liberdade trazida pelas novas tecnologias, mais do que nunca sabemos que a imprensa, em sua mediação da realidade, é falha, e como o é!

É interessante (e triste) ver como, após a criação da internet e das redes, grande parte da imprensa, ao perder o monopólio da verdade, se vêm tornando excessivamente opinativa e crítica das novas tecnologias. Deveria, sim, era aprimorar-se no trabalho para prestá-lo melhor. Acontece que, eis o ponto, como a velha imprensa não é livre de fato, como depende do financiador, muitas vezes de governos, ela vê nas novas tecnologias de ampla liberdade uma ameaça à velha cadeia de produção acostumada a filtrar o que valia ser dito, e o que não valia, em seu óbvio interesse, hoje nu, como o rei da história.

Além disso, há essa coisa interessante: a percepção. Para alguns pensadores do novo mundo, o que chamamos de realidade é uma simulação, no que concordo. Segundo eles, cada um de nós só tem o às coisas através dos sentidos (olfato, visão, tato, audição, paladar). Porém, como cores, cheiros, paladares etc. não existem no mundo concreto (são imateriais), sendo portanto simulações percebidas pelos sentidos (pessoas veem cores em diferentes matizes, quando não divergentes, como os daltônicos), aqueles pensadores sustentam que o mundo como o percebemos seria resultado exclusivo dos nossos sentidos. Assim, a única coisa real seria a razão. É o que diz Descartes, para quem a razão é a única prova da existência. “Penso, logo existo”.

Como amos o mundo virtual pelos mesmos sentidos com que amos o mundo concreto, estando entrelaçados, não haveria diferença entre eles. Logo, não deveríamos condenar o mundo virtual, mas sim o explorarmos melhor. Eu acredito que é assim.

Uma vez provadas as inovações, não é possível retroagir. Podemos, isso sim, é refinar, em decorrência delas, o nosso comportamento.

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Vivendo em mundos paralelos

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Algo mudou na relação entre o jornalismo e os pelotenses. Até por volta de 2015, havia um marcado interesse nos assuntos da cidade. Um mero buraco, e nem precisava ser o negro, despertava vívida atenção. Agora já ninguém dá a mínima. Nem mesmo se o buraco for um rombo fruto de corrupção numa área de vida e morte, como a de saúde. O valor da notícia sofreu uma erosão nas percepções.

Não é uma situação local, mas, arrisco dizer, do mundo. Nós apenas sentimos seus efeitos de forma drástica, por razões de ordem econômica e social. E também dimensionais.

Como a cidade não é grande, os problemas são ainda mais visíveis. Topamos com eles no cotidiano. Acontece que os buracos reais e metafóricos, ainda que denunciados, inclusive pelo cidadão que vai às redes sociais reclamar, avolumam-se sem solução que satisfaça, levando a outro problema, este de ordem comportamental.

Vem ocorrendo uma cisão no vínculo entre as pessoas e o meio em que vivem. Um corte entre elas e a vida social. O espaço, que no ado era público, já hoje parece ser de ninguém.

A responsabilidade parcial disso parece, curiosamente, ser das novas tecnologias de comunicação. Se por um lado elas deram voz à sociedade como um todo, por outro, ao igualmente darem amplo o ao mundo virtual, elas nos têm distraído da concretude do mundo, de interação sempre mais hostil — distraído, enfim, da realidade mesma, propiciando que vivamos em mundos paralelos.

Outra razão é que, no essencial, nada muda em nossa realidade. Isso ficou mais evidente porque as redes sociais deram vazão, sem os filtros editoriais da imprensa, a um volume de problemas reais maior do que o que era noticiado. Se antes já havia demora nas soluções, essa percepção foi multiplicada pelo crescente número de denúncias feitas nas redes pelos próprios cidadãos. Os problemas que dizem respeito à coletividade se avolumam sem solução a contento, desconsolando e fatigando a vida.

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Como a dinâmica da cidade (e da realidade) não responde como deveria, eis o ponto, estamos buscando reparações no ambiente virtual, sensitivamente mais recompensador, além de disponível na palma da mão.

No mundo moderno, não habitamos mais exatamente nas cidades. Estamos habitando no mundo virtual, onde não há frustrações, mas sim gratificação instantânea. Andamos absortos demais em nossa vida. Abduzidos por temas de exclusivo interesse pessoal, retroalimentados minuto a minuto pelo algoritmo.

Antes vivíamos num mundo de trocas diretas entre as pessoas. Hoje habitamos numa nuvem, no cyber-espaço. Andamos parecendo cada dia mais com Thomas Anderson, protagonista do filme Matrix. Conectado por cabos a um imenso sistema de computadores do futuro, ele vive literalmente em uma realidade paralela. Isso dá

Para complicar tudo, há pensadores para quem a realidade é uma simulação.

Segundo eles, cada um de nós só tem o às coisas através dos sentidos (olfato, visão, tato, audição, paladar). Porém, como cores, cheiros etc. não existem no mundo concreto, mas são simulações percebidas pelo nosso corpo (pessoas veem as cores em diferentes tons, quando não em diferentes, como os daltônicos), aqueles pensadores sustentam que o mundo como o percebemos seria resultado dos nossos sentidos.

Assim, a única coisa real seria a razão, quer dizer, o modo como processamos aquelas percepções dos sentidos. É o que diz Descartes, para quem a razão é a única prova da existência. Como amos o mundo virtual pelos mesmos sentidos que amos o concreto, não haveria diferença entre eles.

Segundo aqueles pensadores, como o mundo virtual está entrelaçado com o mundo concreto, não deveríamos condenar o mundo virtual, mas sim o explorarmos melhor.

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