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Quando escrevi a crítica de Guerra Civil, afirmei ser o grande filme do ano até o momento, e que acabou se confirmando como um dos melhores filmes de 2024. Eis que, praticamente 1 ano depois, estamos novamente diante do melhor filme do ano até agora: Pecadores.
Na trama, os gêmeos Smoke e Stack (Michael B. Jordan) voltam à sua cidade natal com o objetivo de reconstruir a vida e apagar um ado conturbado. Esses acontecimentos, porém, voltam a atormentá-los quando uma força maligna a a persegui-los. Esse mal busca tomar conta da cidade e de todos os cidadãos, obrigando-os a lutar para sobreviver.
Ambientado no Delta do Mississippi em 1932, o plano dos irmãos é de transformar uma antiga serraria em um clube musical voltado para a comunidade negra. Eles se juntam ao primo, Sammie Moore (Miles Caton), um jovem e talentoso artista de blues, e ao veterano Delta Slim (Delroy Lindo) como as principais atrações da casa de shows. Entretanto, como revelado em um instigante prólogo, a noite de abertura do clube atrai a atenção de criaturas sedentas por sangue.
Dirigido e roteirizado por Ryan Coogler, Pecadores é a volta do cineasta ao cinema autoral desde Fruitvale Station (2013). Após os sucessos em grandes franquias como Creed e Pantera Negra, Coogler retorna às suas origens ao contar uma história sobre as divisões raciais e de classe nos Estados Unidos, mas sempre com um olhar apurado para as representações culturais e ancestrais, fazendo o uso do horror para expor o pecado dentro de cada um de nós.
Embora os gêmeos de Michael B. Jordan sejam o grande destaque do filme, o verdadeiro protagonista é Sammie, interpretado brilhantemente por Miles Caton. A dinâmica entre o trio é o que guia toda a narrativa. Enquanto os gêmeos representam um ado de pecados, o jovem, filho de pastor, está divido entre seguir os os do pai ou se entregar ao blues.
Com um papel duplo que é um dos melhores de sua carreira, Jordan acerta na vulnerabilidade e na complexidade dos personagens, com um Smoke maduro, enquanto Stack possui um espírito mais livre. Os interesses amorosos também são cruciais para o desenvolvimento dos gêmeos: A sempre talentosa Hailee Steinfeld vive a sensual Mary, um antigo romance de Stack, e a ótima Wunmi Mosaku interpreta a afetuosa e mística Annie, uma mulher que Smoke deixou para trás, e que funciona como uma base de proteção espiritual contra os vampiros. Vale destacar a presenças de Jack O’Connell como Remmick, o líder dos vampiros, e da lenda do blues, Buddy Guy, em uma participação especial.
Tecnicamente, o filme apresenta paisagens e sequências belíssimas, resultando em uma obra única, que brinca com a mitologia sobrenatural e com efeitos visuais impecáveis, com direito a olhares sanguinários dos vampiros. Porém, o que mais me chamou atenção foi a impressionante trilha sonora de Ludwig Göransson, vencedor de dois Oscars (Pantera Negra e Oppenheimer). Em Pecadores, ouvimos a mistura do blues autêntico com elementos contemporâneos que criam uma ponte entre ado e presente. O longa estabelece o blues como uma força libertadora e perigosa, como uma expressão cultural que permite que os personagens transcendam, mas também atrai forças sobrenaturais.
De encher os olhos, uma cena em especial tem tudo para ser memorável. A performance virtuosa de Sammie é tão eletrizante que, literalmente, convoca espíritos através do tempo. É como assistir um encontro entre o ado, o presente e o futuro a partir da música, que foi, e sempre será, um ato de resistência para povos oprimidos.
Intenso e ambicioso, Pecadores é Ryan Coogler em sua melhor forma, em um filme que explora diversos gêneros, aproveitando o melhor de cada um. Com um elenco talentoso e de marcantes presenças femininas, é uma ótima e imperdível produção sobre blues, racismo e misticismo.