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Depois de 12 anos e três mandatos do PSDB à frente da prefeitura, o eleitor pelotense mandou os tucanos de volta para casa. Foi mais que uma rejeição a Fernando Estima, candidato do governo. Foi uma rejeição ao governo da professora Paula Mascarenhas, ao modo tucano de governar. Aparentemente o governo, por fadiga, cansou, e a população se cansou dele. Mas não só isso.
O PSDB teve tudo a seu favor na eleição. Mesmo assim, não foi suficiente. Seu candidato teve o maior apoio partidário (10 partidos), o maior tempo de propaganda eleitoral, o maior fundo eleitoral, a força da “máquina” do governo (mais de 500 pessoas em cargos de confiança foram às ruas empenhadas em eleger Estima e manter seus empregos), 237 candidatos a vereador estavam a apoiá-lo (daqueles 10 partidos da coligação). Contaram ainda com o apoio dos tucanos governador Eduardo Leite e deputado federal Daniel Trzeciak. Todo esse pacote não foi o bastante.
Por que os pelotenses rejeitaram o PSDB?
É um conjunto de fatores e, essencialmente, não têm nada a ver com a polarização política entre esquerda e direita, como têm alegado Estima e Paula. O eleitor pelotense, de maioria pobre, não está preocupado com ideologia. Não existe valeta de esquerda e de direita. Ele está preocupado com os buracos, com o atendimento na Saúde, com a escola dos filhos. Com o dia a dia.
Como o Amigos disse antes das eleições, seria preciso errar muito para perder uma eleição. Acontece que o governo errou muito.
Por mais que aparecessem sorrindo nas fotografias de campanha, era de se perguntar: Do que riam? Da péssima situação da zeladoria da cidade? Dos estagnados indicadores de desenvolvimento? Da degradação do Centro Histórico? Do fechamento sem fim do teatro Sete de Abril? Da I da Saúde? Das mais de 50 mil pessoas na fila de espera para consultas médicas e cirurgias? Dos servidores que tiveram bens bloqueados pela Justiça, por desvio de verba no Pronto Socorro e na Assistência Social? Da falta de vagas na Educação Infantil? Dos baixos indicadores de aprendizado do IDEB? Dos graves problemas de drenagem? Dos alagamentos? Da precariedade viária dos bairros e dos balneários? Dos 70% da população sem esgoto tratado? Da balneabilidade incerta dos balneários? Da péssima situação das contas públicas? Disso, não poderia ser. Do que será que riam então?
Além disso, algumas hipóteses para a derrota, algumas concretas. Algumas já comentadas en ant, mais detalhadas abaixo.
1) A má situação da chamada Zeladoria. Descuidada, a cidade decaiu a olhos vistos, a ponto da sensação de abandono. Nesse sentido a buraqueira pelotense é democrática: pode ser vista em todas as regiões da cidade, na quase totalidade das ruas, em parte por falta de manutenção, em parte pela má qualidade das obras públicas. Obras de terceiro mundo, de péssima qualidade, inacabadas, feias e perigosas, como, por exemplo, a Rótula do shopping (foto acima, de hoje). Mais uma obra padrão prefeitura de Pelotas. Inacabada. Restos de entulho no local e pista com terra e pequenas pedras.
2) Quando se fala em buracos, a palavra é uma metáfora de problemas sistêmicos mais amplos, como por exemplo a falta de obras estruturais, a má situação das contas públicas e a entrega de cargos de confiança a pessoas sem qualificação adequada para ocupá-los, com finalidades meramente de hegemonia política e fins puramente eleitorais, como se viu, pouco antes da eleição, quando a prefeita entregou ao PP as secretarias da Educação e da Assistência Social e mais uma Asssessoria Especial com status de Secretaria. Logo ao PP, partido que, para completar, preside a I que investiga desvios de dinheiro do Pronto Socorro, contaminando as relações institucionais e projetando uma sombra sobre a lisura da investigação.
3) É evidente que a enorme fila de espera para consultas médicas e cirurgias, MAIS DE 50 MIL PESSOAS, afetou negativamente a campanha tucana. Não precisa discorrer mais.
4) A dívida do município, alta, afetou o que já era ruim. Sem a Zeladoria, contida para pagar a dívida, a prestação dos serviços públicos piorou. A sensação, ainda presente, é de uma cidade “largada” à própria sorte. Situação que piorou depois da enchente, quando o pelotense se deu conta de que faltavam obras essenciais. Deu-se conta que faltava um dique na região praiana, um sistema de contenção que protegesse as populações dos balneários, onde vivem mais de 50 mil pessoas. Muitos moradores foram afetados pela enchente e perderam tudo.
5) Como todo governo que fica muito tempo, os tucanos aram a achar que tinham o eleitor cativo e relaxaram. Acostumados com uma sequência de bons resultados eleitorais, os governantes do Paço podem ter acreditado que a boa sorte os acompanharia, apostando que a população entenderia.
6) A pandemia e a enchente podem ter viciado o gabinete principal do Paço na adrenalina desses momentos cruciais, distraindo do trabalho do dia a dia. Distração essa potencializada negativamente por frequentes notícias de viagens internacionais da prefeita e de sua equipe à Europa, para apresentar supostos tentos favoráveis do governo, como os programas Pacto pela Paz e Cidade das Crianças, dois slogans questionáveis, porém, à luz da realidade. Afinal, a queda da criminalidade violenta caiu em todo o Brasil, não só em Pelotas. E, convenhamos, “Cidade das Crianças” é apenas um nome bonito. O governo parece ter acreditado que estava fazendo uma revolução na cidade, quando na verdade estava iludido, embarcado numa onda de felicidade.
7) A pandemia e a enchente podem ter cansado o governo. Ocorre que o candidato do governo não rompeu com a aparência de cansaço oficial, como havia ocorrido antes quando Leite e Mascarenhas se elegeram prefeitos. Estima não trouxe a gana inicial que se viu naqueles dois. Não convenceu como a pessoa que reporia aquela energia. Pareceu um jogador reserva que entrou em campo cansado. A própria prefeita parecia cansada. Virara presidente do PSDB estadual e já falavam que seria governadora, como se estivesse se despedindo de Pelotas para outros voos.
8) A prefeita perdeu gente do seu entorno mais próximo. No fim, parecia um governo sem coesão. A máquina não estava mais funcionando.
9) Os casos de corrupção no governo, especialmente em áreas sensíveis, como a Saúde (Pronto Socorro) e a Assistência Social.
10) Fernando Estima, o candidato escolhido para suceder Paula, não estava na cidade. Não esteve em Pelotas nos momentos difíceis, trabalhando. Estava em Rio Grande, numa alta diretoria do Porto de Rio Grande (do governo do estado), mesmo não tendo completado o ensino médio, o que é uma mensagem altamente negativa. Afinal, o que se espera de um alto diretor de porto? Espera-se que seja um engenheiro naval cheio de grandes pós-graduações, especializado em porto, com estágio digamos no porto de Rotterdam (Holanda). Ele não é a pessoa mais qualificada para dirigir um porto. Não é por causa dele que o porto anda melhor ou pior. Pra quem olhou de fora, a qualificação dele era ser de Rio Grande…