Roberta Paganini não é mais secretária de Saúde de Pelotas. Ela entregou o cargo na tarde desta sexta-feira (3). Em agosto de 2023, ela havia pedido exoneração por causa de “obstáculos na área istrativa”, mas voltou atrás. Agora é definitivo. Ela sai no momento em que está em curso na Câmara de Vereadores uma I para investigar possíveis desvios de dinheiro público do Pronto Socorro Municipal.
Nesta quinta (2), a I ouviu a contadora da Secretaria de Saúde. Priscila Pinto Gonçalves contou aos vereadores que identificou R$ 782 mil em “inconsistências” nas prestações de contas do PS. Todas referentes a pagamentos à empresa de serviços de portaria ao PS nomeada M. de Souza Leão LTDA. Daquele montante, R$ 339.175,70 foram fruto de pagamentos duplicados (feitos duas vezes). O restante teria sido pago sob a alegação de pagamentos de reforço por conta da pandemia da Covid-19. Segundo Priscila, em 2023 houve atraso de nove meses nas prestações de contas por parte do PS. As prestações de contas de 2024, segundo ela, ainda não foram feitas.
Em memorando à prefeita Paula Mascarenhas, do PSDB, anunciando sua saída, Roberta escreveu:
Sra. Prefeita
Considerando que sou uma secretária técnica, servidora pública do Ministério da Saúde, sem vinculação político-partidária, é para mim muito importante, além da sua confiança, ter também a confiança por parte do Conselho Municipal de Saúde e da população que é representada pelos seus vereadores em relação à gestão da Secretaria Municipal de Saúde.
Diante das recentes manifestações públicas de representantes dessas duas instituições, referentes à gestão que vem sendo feita por mim e pela equipe que escolhi, entendo que não devo continuar como secretária de Saúde de Pelotas. Essa não é uma decisão intempestiva. A senhora sabe que já tínhamos acordado minha exoneração para 1º de novembro, mas, em razão do que tenho vivido na gestão da Secretaria, decidi junto com minha família antecipá-la.
Sendo assim, peço a minha exoneração desse cargo a partir desta data, pois tenho a consciência tranquila que nesses quase cinco anos dei meu melhor, me dediquei incondicionalmente para garantir o o da população aos serviços de saúde e para qualificá-los, muitas vezes negligenciando meus familiares e minha saúde.
Nesta gestão, enfrentamos a maior crise sanitária da história das últimas gerações, conduzindo a saúde pública de Pelotas, que é polo regional, fazendo o enfrentamento de forma diferenciada, a ponto de ser reconhecida pela Opas, nosso enfrentamento do Covid, mas também pela manutenção dos demais serviços e condução da gestão.
Em toda a pandemia, transferimos apenas dois pacientes para outro município, mas recebemos centenas da nossa e de outras regiões. Nunca faltou qualquer insumo que inviabilizasse algum serviço de saúde como aconteceu na maioria das cidades.
Desenvolvemos um programa inovador, como o Saúde Ativa, que acabou com a fila de exames de tomografia e ressonância e reduziu em 50% a fila de colonoscopia e endoscopia. Infelizmente, não tivemos recursos para continuar, mas não conheço outro município que complementasse a tabela SUS como nós fizemos.
Também foi nesta gestão que terminamos com as fichas na atenção primária, o que garantiu o o dos pacientes à saúde pública, principalmente depois da pandemia, quando muitos pacientes com doenças crônicas agudizaram.
E após o tempo adequado no pós-pandemia, reorganizamos o atendimento nas UBSs para retomar a promoção e prevenção. O resultado de todas essas ações se traduz em índice de menos de 20% das internações em Pelotas serem de condições sensíveis à atenção primária. Sem falar que foi nesta gestão que todas as equipes aram a estar completas, com médicos e com enfermagem, com autonomia e respaldada por protocolo também inovador, reconhecido pelo próprio Conselho de Enfermagem. Ainda, realizamos a nova territorialização que sempre foi tão pedida que fosse feita para atender áreas de crescimento populacional nos territórios.
Implantamos a Saúde Digital, serviço que me orgulha muito, pois tem feito o monitoramento e acompanhamento de milhares de pacientes crônicos ou com outros agravos que devem ser monitorados. Esse serviço vem fazendo um trabalho primoroso de qualificação das filas das demandas reprimidas da atenção especializada, o que, além de diminuir, prioriza o atendimento para aqueles que são mais graves. Sem contar no matriciamento da atenção especializada para a atenção primária, o que dá o apoio necessário para que essa seja mais resolutiva. Esse trabalho terminou com a fila de consultas de pediatria por exemplo
A assistência farmacêutica teve um ganho enorme em qualidade de atendimento, assim como outras políticas voltadas às populações minoritárias e vulneráveis.
Na rede de atenção psicossocial, ainda me lembro do dia que conheci nosso residencial terapêutico e, hoje, o quanto foi qualificado, trazendo dignidade aos nossos residentes. Também ampliamos para dois residenciais e uma unidade de acolhimento adulto articulada com o Caps AD como tem que ser.
Criamos um programa de educação permanente com as equipes de trabalho para, coletivamente, construir o protocolo de atenção à crise de pacientes em sofrimento mental e, ultimamente, estamos reconstruindo nossos atendimentos infantojuvenis no ambulatório e Caps I e ainda trabalhando para fortalecer o matriciamento para a atenção primária.
Na atenção hospitalar, tivemos muitos avanços, além de termos conseguido o maior impacto financeiro no teto da alta e média complexidade desde a assunção de Pelotas à gestão plena em saúde, atualmente os hospitais cumprem em mais de 95% seus contratos dando conta de uma população crescente e com condições de saúde agravada em razão da pandemia.
Nossas portas de entrada de urgência e emergência também foram qualificadas. A UPA atendia em torno de três mil pacientes e hoje mais de sete mil. No Pronto Socorro de Pelotas, além de ser muito mais humanizado, o tempo médio de espera dos pacientes por um leito clínico ou de UTI reduziu imensamente, mesmo atualmente com superlotação.
Quando cheguei em Pelotas, a traumatologia tinha 900 pessoas aguardando por uma cirurgia e reduzimos em mais de 50 %. As filas de exames e consultas são maiores, mas não devolvemos mais os pacientes para as UBSs, retirando-os das filas, esperando que fossem chamados para perdidos. Também a oncologia tinha uma longa espera pelo primeiro o à consulta oncológica, o que foi regularizado, voltando a ter problemas, no fim de 2022, em razão da crise de anestesistas do HE e financeira da Santa Casa.
A vigilância em saúde também foi priorizada, com ampliação e qualificação das equipes. Basta ver a enorme campanha de vacinação em massa que fizemos de Covid-19, o aumento das coberturas vacinais e o reconhecimento que vigilância sanitária perante várias instituições. Sem falar na qualificação da sala de vacinas que tínhamos no centro de especialidades e, hoje, está na Casa da Vacina com um ambiente muito mais adequado e acolhedor.
O próprio Centro de Especialidades tem ofertado mais à população, com aumento de atendimentos em várias especialidades como pediatria, ginecologia, neurologia, ambulatório da dor, ambulatório de feridas e outras.
Conseguimos aumentar o financiamento federal da SMS em mais de 20% e mais de 40% no estadual e mantendo os mesmos 17% do investimento municipal em saúde.
Melhoramos a relação com nossos parceiros prestadores de serviços, principalmente os hospitalares, mas também com nossos trabalhadores. Criamos espaços de discussão e horizontalizamos a gestão.
Instituímos as apoiadoras técnicas na atenção primária para aproximar a gestão da operação e as Redes Temáticas, que são nove redes que focam em linhas de cuidado, buscando o aprimoramento dos serviços ofertados, desde a prevenção, promoção, tratamento e recuperação da saúde da população de Pelotas e também fazendo as articulações necessárias para o trabalho em rede intra e intersetorial. Além disso, criamos o programa Acolhe Bem, que discute os processos de trabalho da atenção primária para que estejam alinhados com os princípios e diretrizes do SUS.
Fui a secretária que mais esteve na Casa Legislativa, levando toda equipe de gestão para prestar informações à população e seus representantes, com respeito pelo que e por quem representam e por reconhecer que a transparência do gestor público para com a população é um dever, da mesma forma nos conduzimos em relação aos meios de comunicação valorizando o trabalho feito por eles, entendendo que essa parceria e conduta é a que traz maiores benefícios à população. Assim como sempre atendi a todos que me procuraram e nunca deixei ninguém sem uma resposta ou sem um retorno, não importando o dia, a hora ou quem era.
Tivemos e temos muitas dificuldades, especialmente, na área istrativa. A senhora é sabedora dos obstáculos que enfrentamos em tudo que se refere à máquina pública istrativa de Pelotas. Entraves esses que me levaram, entre outras razões, a lhe pedir exoneração, em agosto do ano ado, mas que recuei após seu pedido.
No dia 29 de janeiro, voltamos a conversar e combinamos minha exoneração para o dia 1º de novembro deste ano.
Tenho o maior respeito, iração e gratidão à senhora por tudo que acreditamos e fizemos juntas, por tudo que vi da sua conduta e que conheci da pessoa que a senhora é, mas não tenho mais capacidade para continuar à frente da gestão da SMS.
Tenho absoluta certeza que não preciso ar pelas situações que estou ando, em razão de um palco político-partidário que está sendo feito por estarmos em um ano eleitoral. Podemos, realmente, ter confiado nas pessoas erradas, mas isso faz parte da vida que é vivida com intensidade e dedicação, que é vivida quando se corre riscos para se fazer mais, da vida que é vivida com a consciência que não vamos acertar sempre, mas que vamos fazer o nosso melhor com as condições que temos e com a coragem de assumir a responsabilidade por cuidar das pessoas respeitando a istração pública em todos os seus princípios. Entretanto, hoje tudo que foi feito está sendo diminuído pela pequenez de alguns, movidos por interesses pessoais e privados em detrimento do respeito e da verdade, e eu não sei lidar com as mentiras que as pessoas têm dito, com a falta de respeito e muito menos com a manipulação eleitoreira que vem sendo feita.
Além de tudo, tenho certeza da minha capacidade técnica, dos meus princípios e valores morais e não preciso viver esses tempos.
Despeço-me com o coração entristecido, mas com a consciência e a alma leve pela certeza do quanto fiz pela melhoria da saúde pública de Pelotas junto com uma competente e dedicada equipe de gestão que temos na Secretaria, com grandes parceiros prestadores de serviços de saúde e com o apoio seu e do seu gabinete.
Atenciosamente,
Roberta Paganini Lauria Ribeiro