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TRONCOS BRONCOS. Por Vitor Bertini 5g4f63

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Viajei. Fiquei longe de casa por seis semanas. Voltei: o vizinho da frente mutilou seis árvores.

Transformou minhas janelas pintadas com o céu colorido das estações em um deserto azul de ventos e nuvens irreconhecíveis. Podou tudo.

Tudo ele pode. O terreno é dele; as árvores são dele, os galhos e as folhas eram dele. Só a vista e os sonhos eram meus.

As folhas mudavam de cor denunciando a agem do tempo e embalavam meus textos: as do alto anunciavam chuvas, as do meio dançavam ao sabor dos ventos e as de baixo se deixavam tocar. Em dias de sol ofereciam sombra e murmuravam segredos.

Dignas e belas no alto, caídas emprestavam cores e alma aos aplainados caminhos de pedra (da razão rasteira), e sentimentos ao meu cantar.

Foram-se as folhas. Ficaram os troncos broncos de braços desproporcionais, incapazes de um abraço. Incapazes de um verso.

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Viajei, não vi o gesto. Perdi a vista. Os sonhos ainda são meus.

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