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Cultura e entretenimento 1f3218

JORNALISTA O TEMPO TODO z4m4b

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LM era meu amigo e jornalista o tempo todo. Um clássico.

No tempo dos clássicos, o ar da redação tinha fumaça de cigarro, o teclar das máquinas de escrever era música de fundo, os paletós ficavam nas cadeiras, noite era dia, os fotógrafos estavam sempre indisponíveis e o café era ruim. Na redação, LM sentia-se em casa.

Na rua, elegante, cabelo em desalinho combinando com o nó da gravata, experiente e discreto, ele sabia ouvir e a quem procurar.

Depois, bem informado, na volta ao jornal, as necessárias conversas, o café no bar, as horas ando, alguns cigarros e dois dedos ágeis entregavam uma coluna política de texto limpo e conteúdo instigante, no último momento possível.

Fechada a edição, aberta a noite: LM saia para jantar, beber, cantar e dançar, todos os dias da semana. Tinha amigos, sonhos, echarpes, chapéus, um automóvel Simca Chambord e uma namorada. Na redação, meu amigo estava em casa. Em casa, ele não tinha hora para chegar.

Certa madrugada de hora incerta, contrariando os costumes, encontrou a porta de seu apartamento entreaberta e a esposa de uma vida, sentada na sala. A adrenalina trouxe a sobriedade. Calou, sentou e ouviu.

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– Você tem uma namorada; sei seu nome, seu endereço e tenho as datas e os horários de suas visitas e encontros. Nós vamos nos separar e eu não quero nada. Só tenho uma exigência: quero um jantar na companhia de vocês. Nós três. Quero conhecê-la. Marque e me avise. Suas roupas estão nas malas, e as malas no quarto de hóspedes. Sem o jantar, voltaremos a sentar aqui.

Durante uma semana LM dormiu em um hotel do centro da cidade e pensou na vida.

Temeroso, reservou uma mesa em um restaurante o mais afastado possível de seu circuito habitual – ou de suas fontes – e no último horário disponível.

A viagem de ida foi repleta de sorrisos e o jantar recheado de amenidades e gentilezas recíprocas. O único momento mais tenso foi quando a agora ex perguntou à nova titular:

– Você conhece bem ele? Sabe com quem vai ficar? Eu, fosse você, e na sua idade, não abraçava esta bronca. Mas, sei como é. Já ei por isto. Seja feliz.

Tarde da noite, restaurante vazio, a conta e o Simca no estacionamento. Sem bateria. Nenhuma das mulheres presentes sabia dirigir ou ousou tentar a manobra.

Sentado na direção, vidro do motorista baixado, braço apoiado na porta, segunda marcha engatada, pé na embreagem, a ex e a atual empurrando, e LM só conseguia pensar na dificuldade de conseguir um fotógrafo quando eles eram mais necessários.

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 LM era jornalista o tempo todo.

Página de Vitor Bertini – AQUI.

Depois de tudo, escritor. Autor do livro "Não me Abandone" - Editora Esquina do Lobas e da página "A História da Sexta".

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Brasil e mundo 3m3y11

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio b4o68

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento 1f3218

O perigo das Gagas da vida 1n4w28

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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