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Por anos tive uma mulher como chefe. C. era a chefe geral, a Rainha do andar do Ministério, onde trabalhávamos felizes. Era uma atriz italiana antiga: robusta na medida, bem vestida, feminina. Morena com atitude masculina, dirigente.
Mulher executiva no comando era novo. Ela era uma pioneira, com tudo que isso implica.
Todos gostávamos dela, ainda mais porque cultivava uma atitude zen. Não disparava ordens. Comandava com tato. Mas tinha algo de selvagem que o modo zen não encobria.
Uma vez entrou numa sala de reuniões onde uma maioria de homens a esperávamos e gritou:
“EU QUERO UM HOMEEEM”…
As palavras lhe saíram como o estrondo de uma frustração prolongada, e, ao pronunciá-las para uma plateia em silêncio, ela nos encarou como quem volta de uma convulsão. Armou então um meio sorriso e, depois de mexer em uns papéis em sua mesa, veio até nós e iniciou a reunião, como se nada tivesse ocorrido.
A única vez em que me atrevi a me aproximar fisicamente dela foi numa festa no Clube Naval. Depois daquele dia em que ela clamou por um homem, eu a tirei para dançar. Por três minutos, senti seu corpo próximo, aspirei seu perfume. Seus cabelos me fizeram cócegas no nariz.
– Obrigado pela dança, chefe.
Voltamos para a mesa depois de uma música. Eu me sentei, cocei o nariz, e ficou nisso.
***
Tempos depois a secretária de C., amiga minha, contou que ela conhecera um homem e saíra com ele para jantar. Ele pedira, de entrada, sopa de cebola, pois, como explicara a ela, era louco por cebolas. Ela tentou tomar, mas deixou a sopa pela metade. Ele perguntou se ela não iria terminar. Como ouviu “não”, puxou o prato dela para si e emendou: “Você se importa que eu tome?”
Não, não se importava. Na verdade, agradeceu, e, no fim, dispensou-o para nunca mais.
Meses mais tarde, a secretária me contou outra.
C. dançara em uma festa com um homem que não a conhecia. Gostara da ousadia dele de convidá-la e se divertia na pista. Numa hora, ele dissera no ouvido de C.: “Xonei cocê.” Era goiano, e, ao ouvir essa declaração de fazendeiro do centro-oeste, ela perdera o interesse.
Não era bem um homem que C. queria. Ela desejava “um homem que pudesse irar.”
Sendo ela chefe, que perigo!