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Cultura e entretenimento

Quem roubou nossa coragem? O livro de Mateus Bandeira

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Concluí a leitura de Quem roubou nossa coragem? (pela Esquina de Lombas), escrito por Mateus Bandeira, consultor de empresas e conterrâneo nosso. Os pelotenses, assim como os demais gaúchos, tiveram oportunidade de conhecê-lo melhor em 2018.

Naquele ano, concorrendo a governador do RS pelo partido Novo, ele foi uma voz solitária, porém firme, a favor de ideias incomuns em um país que teve rei e se acostumou a depender do governo. Ideias liberais: menos estado e impostos, mais privatizações, rigor nas contas públicas, maior liberdade econômica para o cidadão trabalhar e prosperar, sem o peso do estado nas costas.

Uma fala em um debate, relembrada no livro, sintetiza sua visão. Um oponente falou que “o governo era o canhão da sociedade”. Mateus contestou: “O canhão não é o governo, mas sim o cidadão que produz e paga impostos”. Uma diferença básica absoluta entre ideologias.

Estamos falando de 124 páginas objetivas, claras, diretas, com algumas tintas sentimentais, uma biografia afetiva e feliz de seu desenvolvimento, até o autor, a convite de João Amoêdo, aceitar concorrer ao Piratini, na circunstância de não ser um político profissional e com um discurso na contramão dos políticos brasileiros tradicionais.

Link do livro na Amazon: www.mateusbandeira.com.br

Tudo deu certo em seu caminho, começado por concurso no serviço público até se estabelecer na iniciativa privada. Com esforço próprio, capacidade e estudo, consolidou uma bem-sucedida carreira. Deu certo inclusive na campanha eleitoral, considerando que foi uma voz isolada do liberalismo em ambiente tropical, teve pouco espaço de propaganda e não contou com fundo partidário. Embora não tenha sido eleito, foi capaz de persuadir mais de 200 mil gaúchos a acreditarem nas ideias inovadoras que propagou.

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As tintas sentimentais do livro são um pouco inesperadas (e simpáticas), como quando o autor relembra afetuosamente a pastelaria Estrela do Mar, no Laranjal, que gerenciou, num momento difícil, durante um verão inesquecível para ele, quando cita o trecho de uma música de Renato Russo ou quando rememora o pai. É natural que soe “inesperado”, pelo menos para quem cristalizou impressões dele de longe.

Mateus Bandeira

De perto, Mateus parece ser o que de longe também parece: uma personalidade inflexível, de rachar no meio. Defensor ferrenho do liberalismo e dos direitos individuais, advoga, por exemplo, uma legislação que permita a posse de armas pelos cidadãos, como nos EUA. De perto, no entanto, é capaz de rir amistosamente, de si mesmo se for o caso, quando confrontado com uma posição oposta a suas convicções, não sem contestá-la, porém, com igual bom humor. De repente a imagem do “cara que defende armas” desaparece. Não se resume de fato a isso.

Link do livro na Amazon: www.mateusbandeira.com.br

Como candidato, Mateus foi o que é (aprendeu a ser) no mundo do trabalho: um executivo. Nele, como nos executivos em geral, a racionalidade precede a emoção; populismo, com ele, é igual a zero. Mesmo que possa não parecer, porém, a emoção está lá, como se verifica no livro, aliás, muito bem escrito. Depois que o conheci melhor, minha impressão é de que apenas a mantém sob controle, para que não atrapalhe o discernimento.

Abaixo, um trecho do livro:

“Entre as aventuras da pastelaria e minha primeira ida ao Laranjal, em campanha, aram-se 28 anos. Comigo, um punhado de santinhos, os folhetos com as propostas da candidatura, familiares e amigos. No caminho, comprovando que somos o conjunto de nossas memórias, a forte lembrança dos cheiros, das imagens, dos sons e até do gosto de nossos pastéis. Quando paramos, Lagoa dos Patos à frente, antes de distribuir a primeira propaganda, lembrei-me da nossa maior hesitação à época: a manutenção, ou não, do nome Estrela do Mar. Na adaptação e no improviso de um verso de Drummond, a certeza de que acertamos. Acertamos na manutenção do nome, acertamos nos sonhos:

Eu não vi o mar

não sei se o mar é bonito,

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não sei se ele é bravo.

O mar não me importa.

Eu vi a lagoa.

A lagoa, sim

A lagoa é grande,

como os sonhos de nossa gente”.

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***

Mateus Bandeira é apresentado no livro com a seguinte descrição: É brasileiro, gaúcho, consultor e conselheiro de istração de empresas, torcedor do Grêmio Esportivo Brasil, carateca, casado com a Daniela, pai dos gêmeos Mateus e Pedro. Tem graduação em Tecnologia da Informação pela Universidade Católica de Pelotas e MBA pela The Wharton School – University of Pennsylvânia. Entre 2011 e 2017, foi CEO e Managing Partner da então Falconi Consultores de Resultado. Antes, entre outras funções públicas, foi presidente do Banrisul e secretário de estado do Planejamento e Gestão.

Jornalista e escritor. Editor do Amigos de Pelotas. Ex Senado, MEC e Correio Braziliense. Foi editor-executivo da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi). Atuou como consultor da Unesco e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Uma vez ganhador do Prêmio Esso de Jornalismo, é autor dos livros Onde tudo isso vai parar e O fator animal, publicados pela Editora Lumina, de Porto Alegre. Em São Paulo, foi editor free-lancer na Editora Abril.

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Brasil e mundo

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento

O perigo das Gagas da vida

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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