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A biografia de Hitler, de Ian Kershaw 6v1a10

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Estou lendo a biografia de Hitler, o nacionalista fóbico, na excelente edição do livro de Ian Kershaw, que adquiri na Livraria Mundial.

Muito jovem, quando ainda vivia em Viena, onde o prefeito era um politicamente bem-sucedido antissemita, Hitler captou que eleger um inimigo interno para odiar, no caso os judeus, aglutinava forças políticas, e fez desse ódio seu mantra. A época o ajudou. Com os impérios em queda, a ideia da formação de nações ganhava força.

Nações requeriam “espírito nacionalista”, algo que se revelaria nocivo, já que inibe as diferenças culturais, regionais e individuais dentro de um mesmo território, forçando as pessoas a um bloco sem matizes, de pensamento único – contra outros povos. Os judeus não se encaixavam nesse bloco, na visão dos nazistas, por razões raciais e por serem transnacionais. Espalhados pelo mundo, judeus não tinham pátria. Logo, para nazis, não possuíam “sentimento nacional”.

É um fato interessante: muito antes da Globalização se estabelecer no mundo, os judeus já eram globalistas (ou internacionalistas ou cosmopolitas), o que Hitler associava ao comunismo, assim como fazem, hoje em dia, os neo-nacionalistas brasileiros, quando creditam o “comunismo disfarçado” dos partidos de centro-esquerda ao judeu-húngaro “globalista” George Soros, seu suposto “financiador”.

Livro disponível na Livraria Mundial

Kershaw retrata um Hitler emocionalmente perdido, sem pai nem mãe, sem profissão, sem saber o que fazer da vida, até que a Primeira Guerra lhe deu um sentido, uma razão para viver e morrer. Alistou-se no Exército e, por ele, trilhou seu caminho na política até virar chanceler e dar vazão às suas imprecações além das fronteiras.

Tinha um único talento, segundo Kershaw: era bom de gogó. Seu discurso não era original; seu modo de falar, era. Com uma “linguagem expressiva, direta, vulgar, simples – aquela usada e compreendida pela maioria da plateia – e frases curtas e vigorosas”, levava multidões ao clímax de uma satisfação orgástica. Começava lento e gradativamente ia subindo o tom até atingir o êxtase. As massas correspondiam na mesma intensidade.

Tudo começou para ele quando pediu a palavra numa cervejaria, onde faziam comícios. Apelando aos instintos mais baixos, fóbicos e ufanistas, foi longe. De tribuno de cervejaria ao posto de ditador. O problema, todo mundo sabe: “Foi longe demais”. Muito antes de os tanques alemães perderem os freios na Tchecoslováquia, já havia ultraado os limites do tolerável.

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Freud e sua filha Anna, interrogada pelos nazis

* Curiosidade: Freud, judeu, caiu fora de Viena depois que Hitler anexou a Áustria. As perseguições a judeus austríacos começaram e sua filha Anna foi conduzida pela Gestapo para interrogatório, levando em segredo no bolso uma dose suficiente de veronal para a eventualidade de se matar caso decidissem torturá-la. Aos 82 anos, Freud viu-se obrigado a exilar-se em Londres, onde morreu. Na alfândega, obrigaram-no a uma declaração de que não havia sido maltratado. Ele assinou, acrescentando de boca um comentário irônico: “Posso recomendar altamente a Gestapo para todos”.

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