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Pais necessários 171a10

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Feliz o mundo das propagandas do Dia dos Pais, onde todos os pais são maravilhosos, o que aliás me contempla, pois tive o privilégio de ter um pai assim. No Brasil real, no entanto, isso está longe de ser unanimidade: os mais diversos problemas envolvem a paternidade, do abandono à negligência, ou até situações de violência, questões essas que merecem reflexão e iniciativas, pois vão além das famílias, afetam a sociedade inteira.

Estudos sobre conduta violenta em jovens, por exemplo, apontam ao lado de outros fatores a ausência paterna, como demonstrado por pesquisas, em nosso meio, do psicólogo Jorge Trindade (publicadas em seu livro sobre Delinquência Juvenil). O percentual de ausência do pai, entre adolescentes infratores, é significativamente maior do que entre a população em geral.

O papel paterno não se restringe à esfera biológica, existe a paternidade afetiva, onde tios, avós, padrastos, ou até vizinhos ou amigos da família podem representar simbolicamente essa função para as crianças e adolescentes. A psicanálise freudiana estudou profundamente essa função simbólica, relevante desde o sentimento de proteção e segurança afetiva até a internalização de limites. Jung, ao estudar os arquétipos e o inconsciente coletivo, encontrou papéis simbólicos presentes nas mais diversas culturas e sua relevância para a psique humana.

Trabalhando como Psiquiatra e vendo muitas crianças e jovens sem registro do pai na certidão de nascimento, participei de um grupo de terapeutas de família que levou a questão às esferas governamentais, tempos atrás, quando nos foi dito que “nossa campanha agora é ‘registre seu filho’, a questão da paternidade pode ser num momento posterior”. Esse momento nunca chegou, até hoje não existe qualquer iniciativa dos poderes públicos (nem federal, nem estadual, nem municipal) para garantir os direitos das crianças e adolescentes ao registro do pai, com suas consequências jurídicas.

Muitas questões culturais estão envolvidas nessa negligência, que incluem frases que ouvimos com frequência das genitoras tais como “se ele registrar vai ter direito a visitas”, o que, por motivos variados, elas gostariam de evitar. É uma equação complexa, portanto, que envolve não apenas as instituições mas a própria cultura popular e comportamentos já tradicionais, como a confusão de papéis entre as relações conjugais e a parentalidade. Ou seja, não é nada simples identificar as complexidades e enfrentar essas questões, mas negá-las e nada fazer não vem ajudando em nada.

Ter um pai biológico devidamente registrado, que no mínimo ajude na subsistência através da pensão, não impede outras formas de vínculos tais como os pais afetivos, de pessoas que pela ligação emocional desenvolvam essas relações de cuidado, proteção e apoio tão importantes para as crianças e jovens. Existem várias formas de pai e, no sentido mais sadio dessa palavra e dessa função simbólica, todos são necessários.

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