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LANCHE AJANTARADO 432o45

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Valdemar disse ”então”, mais não disse, e começou a montar um sanduíche.

– Diga, Valdemar.
– Diga?
– Valdemar, você nunca diz ”então” para ficar calado. Digamos que eu conheça meu eleitorado.
– Então… – repetiu Valdemar, já de boca cheia, levantando da mesa.

Jurema esboçou um sorriso, desviou o olhar para o relógio bobo do microondas, acompanhou os os do marido pelo reflexo na porta da adega e começou a servir-se.

O jantar, servido na copa, de jantar tinha o nome – cada membro da família montava seu lanche com as opções trazidas à mesa – e o horário de início, 20h30. Quando o terceiro prato estava lavado, a família havia jantado.

No caminho da cozinha, ainda mastigando, e antes que a esposa mudasse de humor, Valdemar retomou seu assunto:

– Marisa não vem jantar? – Perguntou, terminando de engolir e servindo-se, direto do misturador da pia, um copo com água.
– Água da torneira, Valdemar?
– O que é que tem?
– Tem água servida aqui na mesa, Valdemar. Ninguém nesta casa bebe água da torneira. Nem você. O que é que há?

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Valdemar devolveu a água à pia, o copo ao balcão, tomou o rumo de volta à mesa e não sentou.

– Você já falou com nossa filha?
– Como assim? Falo com a Mari todos os dias. Que história é essa? E quer fazer o favor de parar de caminhar feito uma barata tonta? Senta, por favor.

Com os olhos Jurema conduziu o marido até a cadeira, respirou fundo e concluiu:

– Com relação ao jantar, mandei uma mensagem e ela ainda não viu. Deve estar com as amigas. Não me falou nada sobre não jantar em casa.

Depois, suspirou, arrematando:

– Mas, não é sobre o jantar da Mari que você quer falar, certo?

Foi outro olhar da esposa que fez com que Valdemar desistisse de dar uma nova mordida no sanduíche:

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– Ela está ficando moça. Acho que você deveria falar com ela.
– Sobre?
– Essas coisas de mulher. Sexo. Os meninos, os cuidados. Sei lá… Não sei como dizer, mas sei bem com o que me preocupo.
– Pois é… Também me preocupa um pouco…  Mas, vou ser sincera: por incrível que pareça, não sei bem como falar. Minha mãe nunca falou nada comigo…
– Ju, os tempos são outros. Agora, você é a mãe. Você é mulher e sabe que os tempos são outros. Eu é que não vou falar. Mas, alguém precisa falar. Logo…

Naquela noite, o último prato do jantar, o da adolescente filha Marisa, a Mari, foi lavado às 23h30.

Meses depois, em outro lanche ajantarado, quando novamente só o casal bebia a água que estava à mesa, Jurema voltou às falas:

– Valdemar, falei com a Mari.
– Sobre? – Perguntou Valdemar, distraído, mordendo seu sanduíche.
– Fritos, Valdemar, fritos!
– Sobre sexo? – Exclamou o marido, quase se engasgando.
– Então.
– Muito bem! Muito bem! E o que ela disse?
– Disse que eu preciso me atualizar.

Página do Vitor Bertini – AQUI.

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