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Cultura e entretenimento 1f3218

LANCHE AJANTARADO 432o45

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Valdemar disse ”então”, mais não disse, e começou a montar um sanduíche.

– Diga, Valdemar.
– Diga?
– Valdemar, você nunca diz ”então” para ficar calado. Digamos que eu conheça meu eleitorado.
– Então… – repetiu Valdemar, já de boca cheia, levantando da mesa.

Jurema esboçou um sorriso, desviou o olhar para o relógio bobo do microondas, acompanhou os os do marido pelo reflexo na porta da adega e começou a servir-se.

O jantar, servido na copa, de jantar tinha o nome – cada membro da família montava seu lanche com as opções trazidas à mesa – e o horário de início, 20h30. Quando o terceiro prato estava lavado, a família havia jantado.

No caminho da cozinha, ainda mastigando, e antes que a esposa mudasse de humor, Valdemar retomou seu assunto:

– Marisa não vem jantar? – Perguntou, terminando de engolir e servindo-se, direto do misturador da pia, um copo com água.
– Água da torneira, Valdemar?
– O que é que tem?
– Tem água servida aqui na mesa, Valdemar. Ninguém nesta casa bebe água da torneira. Nem você. O que é que há?

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Valdemar devolveu a água à pia, o copo ao balcão, tomou o rumo de volta à mesa e não sentou.

– Você já falou com nossa filha?
– Como assim? Falo com a Mari todos os dias. Que história é essa? E quer fazer o favor de parar de caminhar feito uma barata tonta? Senta, por favor.

Com os olhos Jurema conduziu o marido até a cadeira, respirou fundo e concluiu:

– Com relação ao jantar, mandei uma mensagem e ela ainda não viu. Deve estar com as amigas. Não me falou nada sobre não jantar em casa.

Depois, suspirou, arrematando:

– Mas, não é sobre o jantar da Mari que você quer falar, certo?

Foi outro olhar da esposa que fez com que Valdemar desistisse de dar uma nova mordida no sanduíche:

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– Ela está ficando moça. Acho que você deveria falar com ela.
– Sobre?
– Essas coisas de mulher. Sexo. Os meninos, os cuidados. Sei lá… Não sei como dizer, mas sei bem com o que me preocupo.
– Pois é… Também me preocupa um pouco…  Mas, vou ser sincera: por incrível que pareça, não sei bem como falar. Minha mãe nunca falou nada comigo…
– Ju, os tempos são outros. Agora, você é a mãe. Você é mulher e sabe que os tempos são outros. Eu é que não vou falar. Mas, alguém precisa falar. Logo…

Naquela noite, o último prato do jantar, o da adolescente filha Marisa, a Mari, foi lavado às 23h30.

Meses depois, em outro lanche ajantarado, quando novamente só o casal bebia a água que estava à mesa, Jurema voltou às falas:

– Valdemar, falei com a Mari.
– Sobre? – Perguntou Valdemar, distraído, mordendo seu sanduíche.
– Fritos, Valdemar, fritos!
– Sobre sexo? – Exclamou o marido, quase se engasgando.
– Então.
– Muito bem! Muito bem! E o que ela disse?
– Disse que eu preciso me atualizar.

Página do Vitor Bertini – AQUI.

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Depois de tudo, escritor. Autor do livro "Não me Abandone" - Editora Esquina do Lobas e da página "A História da Sexta".

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Brasil e mundo 3m3y11

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio b4o68

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento 1f3218

O perigo das Gagas da vida 1n4w28

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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