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Brasil e mundo

Dois governadores, duas narrativas

Fiquei curioso. Primeiro, pela similaridade da estética entre o governadores (Doria e Leite) e, em segundo lugar, pelo detalhe de seus cabelos. Assim como a personagem que assombrava o professor Nash, os cabelos dos senhores mandatários também não cresciam

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É lugar-comum, nas análises sobre a cena político-partidária brasileira, a constatação da falta de identidade ideológica, ou mesmo programática, dos incontáveis partidos nacionais. Em sua maioria, um conjunto de lideranças regionais e interesses eleitorais localizados, reunidos sob uma sigla nacional e genéricas palavras de ordem – ou simples empreendimentos comerciais. Nesta generalização, é curiosa a situação do PSDB.

No espetacular filme Uma Mente Brilhante, de 2001, baseado no livro que conta a história do Prêmio Nobel de Economia de 1994, John Forbes Nash, e sua luta contra a esquizofrenia, existe uma agem interessante: o matemático, já diagnosticado e consciente de sua doença, discute com um casal sobre a necessidade de seguir com seu trabalho de análises secretas em favor do governo americano. Este era o ponto. Seria o casal real ou fruto de sua enfermidade? Nash, interpretado por Russell Crowe (em atuação que lhe valeu a indicação ao Oscar de melhor ator), resolve o dilema a partir da observação sobre o não envelhecimento da jovem que compõe o casal. O tempo ava e ela não apresentava sinais de envelhecimento ou mudança de penteado. Ela era uma mentira de sua mente brilhante.

Durante o enfrentamento da pandemia que se abateu sobre todos nós – e as discussões sobre os diferentes métodos e procedimentos que cada um deveria seguir –, um detalhe chamou minha atenção: a uniformidade de comportamento, discursos e padrão das fotos dos governadores dos estados do Rio Grande do Sul e de São Paulo. Isolados, determinando o fechamento de todas as atividades consideradas não essenciais, suas aparições e imagens significavam a própria materialização da mensagem do discurso.

Solitários e à frente de seus computadores, transmitiam, com suas atitudes capturadas por distantes fotógrafos, o exemplo a ser seguido.

Entretanto, sem precisar lutar contra nenhuma esquizofrenia, fiquei curioso. Primeiro, pela similaridade da estética entre o governadores citados e, em segundo lugar, pelo detalhe de seus cabelos. Assim como a personagem que assombrava o professor Nash, os cabelos dos senhores mandatários também não cresciam. Por decisões governamentais, as barbearias e salões estavam fechados e as fotos mostravam governadores isolados do mundo. Não é necessário ter uma mente brilhante para concluir que em algum momento alguém transformava o corte dos cabelos palacianos em uma atividade essencial.

Entretanto, parece que as identidades não terminam por aí. Vamos aos fatos, em duas séries de acontecimentos.

A primeira: no ano de 2015, o parlamento gaúcho, por iniciativa do Executivo, aprovou uma elevação extraordinária de alíquotas de seu Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (sic), o popular ICMS, pelo prazo de três anos. Extraordinária porque temporária. Em 2018, fim do prazo das alíquotas majoradas, a pedido do então governador eleito, Eduardo Leite (PSDB), o extraordinário foi estendido, pelo mesmo parlamento, por mais dois anos, até 2020.

Em 2020, o Palácio Piratini, sede do Executivo gaúcho, encaminhou à nova composição da Assembleia Legislativa um projeto de lei, o PL 246/2020, que visava, fundamentalmente, prorrogar mais uma vez a majoração das extraordinárias alíquotas. Sem maioria para aprovar sua pretensão – um novo período, agora de quatro anos –, o governo gaúcho acatou uma proposta alternativa, de iniciativa do Partido dos Trabalhadores, e o aumento (ainda extraordinário) de alíquotas foi estendido por mais um ano. Agora, em 2021, cessarão os efeitos das majorações oriundas das contínuas excepcionalidades, e as alíquotas do imposto cujo nome oficial carrega 21 palavras no estado do Rio Grande do Sul voltarão ao seus valores originais, de 2015.

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A segunda: em janeiro deste ano, precisamente no dia 15, entrou em vigor o Decreto 65.255, de 15 de outubro de 2020, assinado pelo governador do estado de São Paulo, João Doria (PSDB). No decreto, um aumento da alíquota de ICMS para o setor de bares, restaurantes e similares da ordem de 15,31% – a alíquota era de 3,2% e ou para 3,69%. O mesmo decreto, em seu último parágrafo, estabeleceu seus efeitos pelo prazo de 24 meses. Fixos. Mas, em 15 de setembro, o mesmo governador anunciou o retorno da alíquota para 3,2% a partir de 1.º de janeiro de 2022.

Estes são os fatos. Estes são os acontecimentos. Dependendo de seus objetivos e interesses, o leitor pode acrescentar pequenas nuances ou sutilezas legais em cada um dos parágrafos acima. Mas nada que altere a essência das propostas ou decretos. Assim como o objetivo das pequenas transgressões às regras de isolamento foi a preservação, a todo custo sanitário (regras deles), de suas estéticas e imagens, os objetivos dos acontecimentos acima narrados sempre foi o de colocar mais dinheiro nas mãos dos governos de plantão. Ponto.

Entretanto, ainda devotos das imagens e suas projeções, os mandatários dos palácios Piratini e Bandeirantes anunciaram, respectivamente, uma proposta orçamentária para 2022 com redução de impostos, e a redução, a partir de 1.º de janeiro vindouro, das alíquotas para o setor de bares e restaurantes de São Paulo. Reduções de ICMS!

A palavrinha da moda que explica a série de fotos, representações e declarações chama-se narrativa. E a dona narrativa, para ficar em outra palavrinha da moda, é a ardilosa mãe das fake news, as informações noticiosas que não representam a realidade, mas que são divulgadas como se fossem.

Os governadores gaúcho e paulista, pré-candidatos à Presidência da República, estão divulgando duas grandes fake news: não é verdade que estejam encaminhando propostas com reduções de ICMS ou diminuindo alíquotas. São só narrativas. Estão apenas retomando a cobrança aos patamares anteriores, antes dos aumentos que eles mesmos instituíram ou prorrogaram.

O Partido da Social-Democracia Brasileira, para estranhamento e risco do Brasil, parece ganhar um padrão.

Mateus Bandeira, conselheiro de istração e consultor de empresas, foi CEO da Falconi, presidente do Banrisul e secretário de Planejamento do Rio Grande do Sul.

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Mateus Bandeira é conselheiro de istração e consultor de empresas. Foi CEO da Falconi, presidente do Banrisul e secretário de Planejamento e Gestão do Rio Grande do Sul.

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CCJ do Senado aprova fim da reeleição para cargos do Executivo

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A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com a reeleição no Brasil para presidente, governadores e prefeitos foi aprovada, nesta quarta-feira (21), na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A PEC 12/2002 ainda aumenta os mandatos do Executivo, dos deputados e dos vereadores para cinco anos. Agora, o texto segue para análise do plenário do Senado.

A PEC previa o aumento do mandato dos senadores de oito para dez anos, mas a CCJ decidiu reduzir o tempo para cinco anos, igual período dos demais cargos. A proposta ainda unifica as eleições no Brasil para que todos os cargos sejam disputados de uma única vez, a partir de 2034, acabando com eleições a cada dois anos, como ocorre hoje.

A proposta prevê um período de transição para o fim da reeleição. Em 2026, as regras continuam as mesmas de hoje. Em 2028, os prefeitos candidatos poderão se reeleger pela última vez e os vencedores terão mandato estendido de seis anos. Isso para que todos os cargos coincidam na eleição de 2034.

Em 2030, será a última eleição com possibilidade de reeleição para os governadores eleitos em 2026. Em 2034, não será mais permitida qualquer reeleição e os mandatos arão a ser de cinco anos.  

Após críticas, o relator Marcelo Castro (MDB-PI) acatou a mudança sugerida para reduzir o mandato dos senadores.

“A única coisa que mudou no meu relatório foi em relação ao mandato de senadores que estava com dez anos. Eu estava seguindo um padrão internacional, já que o mandato de senador sempre é mais extenso do que o mandato de deputado. Mas senti que a CCJ estava formando maioria para mandatos de cinco anos, então me rendi a isso”, explicou o parlamentar.

Com isso, os senadores eleitos em 2030 terão mandato de nove anos para que, a partir de 2039, todos sejam eleitos para mandatos de cinco anos. A mudança também obriga os eleitores a elegerem os três senadores por estado de uma única vez. Atualmente, se elegem dois senadores em uma eleição e um senador no pleito seguinte.

Os parlamentares argumentaram que a reeleição não tem feito bem ao Brasil, assim como votações a cada dois anos. Nenhum senador se manifestou contra o fim da reeleição.

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O relator Marcelo Castro argumentou que o prefeito, governador ou presidente no cargo tem mais condições de concorrer, o que desequilibraria a disputa.

A possibilidade de reeleição foi incluída no país no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1997, mudança que permitiu a reeleição do político em 1998.

“Foi um malefício à istração pública do Brasil a introdução da reeleição, completamente contrária a toda a nossa tradição republicana. Acho que está mais do que na hora de colocarmos fim a esse mal”, argumentou Castro.

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Um homem coerente

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Eis um homem que irei pela absoluta coerência entre o que pensava e o modo como viveu. Um homem de esquerda que me fazia parar para ouvi-lo, porque o que dizia tinha solidez e fazia pensar.

Não precisava concordar com ele para irá-lo. E sim: um homem de esquerda que nunca roubou. Foi uma pessoa rara. Eu diria, única.

Vivia num sítio, dele de fato, com o essencial. Na companhia da mulher e de cachorros. Só tinha um defeito: andava em má companhia internacional. Talvez por um motivo humano. Para se sentir menos sozinho do que era. Menos prisioneiro de suas convicções.

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