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Covid: pensando no lado dos empresários e comerciantes l5q1r

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A pandemia impôs muitas crueldades. À vida diretamente, pessoas afogadas em sangue. A morte mais injusta é por sufocamento, em todos os sentidos.

Além das perdas humanas, tem sido triste ver negócios fechando, alguns empreendimentos resultado de muitos anos de esforço em um país que mais atrapalha o empresário que o ajuda.

Desemprego, desalento. Angústia, medo. Quadros mentais abalados, como confirmou a UFPel em pesquisa.

Há algum tempo vi uma postagem que me tocou.

Uma empresária, após décadas de trabalho, se despediu dos clientes numa postagem nas redes. Agradeceu a todos e avisou que encerrava um ciclo para, adiante, começar outro. Não disse se era em razão da pandemia, mas deduzi que sim.

Uma foto singela de si, sorriso suave, grande dignidade.

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Pois este post foi o primeiro a me despertar empatia com o comerciante, primeiro a me fazer entender o lado da pessoa-empresária, feita, afinal, do mesmo sedimento de todos nós.

Até ver este post, as vozes críticas das entidades empresariais à gestão da crise pelo poder público, embora consideráveis, não me haviam surtido empatia. A empatia veio quando vi o reflexo da crise em um rosto, revelado em um semblante sereno, sem rancor.

O relato de um encerramento, sem receio da exposição, tem um poder que nenhum argumento crítico pode ter, a lembrar qualquer coisa dos ensinamentos de Gandhi.

Como há muita pobreza em Pelotas, e muito rancor social, para muitos os argumentos das lideranças empresariais que defendem o funcionamento dos negócios em meio à pandemia soam arrogantes. Como se, para estes, o dinheiro fosse mais importante que a vida.

Numa sociedade ideal, talvez pudéssemos ficar todos em casa até o fim da crise sanitária.

Ocorre que, no sistema que temos, o trabalho é uma coluna na vida.

Ele, o trabalho, é mais importante que o dinheiro, pelo senso de utilidade que imprime nas pessoas.

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Não é o dinheiro em si o valor central na vida, mas sim o que ele significa de empenho, de sonho, de recompensa pela nossa dedicação. O trabalho justifica nossa presença no mundo, é o nosso respirador essencial.

Acabe-se com o trabalho… O que nos sobrará que gratifique a existência ao ponto de não nos degradar?

Quando converso com as pessoas de perto, vejo que os empresários igualmente se preocupam com a vida alheia, não menos que os cientistas, cada qual porém no quadrado da realidade que lhe cabe.

O que as lideranças empresariais dizem é razoável: que os governos, até pela ajuda federal, deveriam ter investido mais maciçamente na estrutura de saúde, leitos de UTI. Isto teria feito toda a diferença.

Porque a onda do vírus, cedo ou tarde, nos alcançaria. É a lógica da onda, avolumar-se, engolfar tudo e todos até quebrar na rebentação.

O vírus não pode ser contido, tudo é uma questão de graduação e tempo.

Para os empresários, se o governo tivesse garantido boa retaguarda, a coexistência entre saúde, distanciamento e trabalho poderia ter sido menos aflitiva e punitiva do que tem sido. Além disso, garantir salários mais atrativos aos profissionais de saúde.

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Pelotas paga muito menos do que deveria pagar aos seus profissionais, ao menos neste momento de emergência.

No dia 15 deste mês, mais de cinco meses do início da pandemia, em resposta ao Amigos, a prefeitura informou que, em Pelotas, um médico ganha em média R$ 5 mil, enfermeiro, R$ 2.307, e técnicos em enfermagem, R$ 1.045. É pouco.

Disse ainda que “está estudando” alternativas para melhor remunerar médicos plantonistas para atuarem em urgência e emergência da Covid. É um pouco inquietante que, nesta altura, ainda esteja estudando

Uma médica que entrevistei outro dia, moradora de Santa Catarina, viajou para atuar em um Hospital de Campanha em Roraima, onde o governo paga R$ 13 mil mensais, condigno com a emergência e o risco a que se expõem aqueles profissionais. Por aí se pode ter ideia de como a realidade local poderia ter sido outra.

Para lideranças empresariais, a economia não precisaria ter sido tão sacrificada, inclusive porque as projeções de infectados e doentes haviam sido apresentadas pela Universidade Federal de Pelotas.

Como o lockdown longo não seria possível, porque provocaria uma quebradeira geral, a prefeitura vem adotando protocolos restritivos em termos, ora em bandeira laranja, menos gravosa, ora em vermelha, mais gravosa, hoje um híbrido entre laranja e vermelha, com tons acentuados para a segunda cor.

As restrições, curiosamente, não estão tendo resultado no sentido de frear contágio e internações.

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As internações, hoje, estão em 90% de novo, apenas quatro dias depois de a prefeitura anunciar, no afogadilho, a abertura de 10 novos leitos, na Beneficência.

No anúncio dos leitos novos, a prefeita avisou que logo seriam ocupados.

O que fará agora, na iminência de nova lotação da oferta, é uma incógnita.

Os poetas são necessários, mas os empresários são mais. Porque são eles, afinal, que produzem riqueza e fazem o mundo girar.

A angústia dos empreendedores, embora a alguns pareça secundária nesse momento, não é.

Num primeiro momento, algumas manifestações pareceram insensíveis.

Pode uma e outra manifestação ter sido ou soado insensível, negacionista. Estou certo de que não sejam “más pessoas”.

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Só estão perplexas, como todo mundo.

Jornalista e escritor. Editor do Amigos de Pelotas. Ex Senado, MEC e Correio Braziliense. Foi editor-executivo da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi). Atuou como consultor da Unesco e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Uma vez ganhador do Prêmio Esso de Jornalismo, é autor dos livros Onde tudo isso vai parar e O fator animal, publicados pela Editora Lumina, de Porto Alegre. Em São Paulo, foi editor free-lancer na Editora Abril.

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6 Comments

6 Comments 4j6h34

  1. Alarico

    19/08/20 at 21:03

    Parabéns, Rubens!!!
    Texto muito lúcido, como sempre. Se me fosse permitido eu acrescentaria a ele apenas duas palavras: onde dizes que “poetas são necessários…” eu colocaria “poetas e pesquisadores alarmistas são necessários…”, pois sem produção não há lugar para a vida… e nem para a poesia.

    • Rubens Spanier Amador

      26/08/20 at 04:33

      Obrigado, Alarico. Abração.

  2. Guilherme Moncks

    19/08/20 at 19:22

    Muito bom, Rubens.

    • Rubens Spanier Amador

      19/08/20 at 20:05

      Obrigado, Guilherme. Abc.

  3. Gilberto Moura

    19/08/20 at 16:48

    Muito bom, Rubens. Muito bom .Escrito com muita clareza e sensibilidade.Penso que retratou bem a realidade e as dificuldades que todos nós amos nestes dias difíceis.

    • Rubens Spanier Amador

      19/08/20 at 18:37

      Obrigado, Moura. Que tudo e em breve, que estamos todos precisados. Abraços.

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Brasil e mundo 3m3y11

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio b4o68

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento 1f3218

O perigo das Gagas da vida 1n4w28

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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