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AGORA É TARDE! 4x1g1

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Ontem, sexta-feira (31), a ocupação de leitos de UTI disponíveis para pacientes adultos de covid em Pelotas bateu em 90%, uma marca inquietante. De certa forma, esperada.

Em cinco meses da pandemia, a prefeitura não conseguiu ampliar a oferta daqueles leitos, que na quase totalidade do tempo foram em número de 31.

Há pouco, pressionada, a prefeita Paula anunciou mais quatro leitos na Beneficência, um alento, ainda que modesto e tardio. Hoje, a impressão é de que o sistema de saúde pelotense, para covid, está por um fio.

Ontem, o governo do estado voltou a classificar Pelotas em bandeira vermelha, “risco alto de contágio”. Hoje em dia, podemos dizer que o foco da classificação das bandeiras é equivocado.

Na verdade, como o vírus se propaga facilmente e rápido, o risco de contágio sempre foi alto. Mesmo com as pessoas respeitando o distanciamento e a higiene, sempre foi uma questão apenas de tempo.

Falam no vírus como uma onda por isso. Inevitavelmente uma onda vai se avolumando e ando por cima de tudo até quebrar na rebentação. A lógica da onda é essa.

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Para que a população não ficasse desprotegida, os governos deveriam ter feito o que não fizeram, investir no fortalecimento e na expansão do sistema de saúde.

O fato de alegarem falta de recursos, mais a urgência da situação, vem produzindo todo o estresse.

Estresse é assim: aparece quando nossa capacidade de resposta aos incitamentos entra em pane, embota e claudica.

Olhando os números, o cenário é pessimista.

Os tais dias difíceis chegaram e, com eles, o temor da iminência de que alguém possa bater na porta de um hospital sem que consiga ser recebido.

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Todos estão pressionados, até os Planos de Saúde. No começo da pandemia, um diretor de Plano me disse que possuía 1 leito de UTI em sua sede, mas que, precisando de mais, os alugaria em hospitais.

O problema é que não há leitos para locação em hospitais e, se existem com aquela finalidade, então estariam reservados para os planos, o que não parece razoável numa hora de necessidade, em que o que está em jogo é a vida de todos, mesmo das pessoas sem plano.

Ultimamente o reitor da UFPel, Pedro Hallal, tem sido muito criticado. Algumas pessoas, contrárias à tese do isolamento, aram a chamá-lo, nas redes, de P. Lockdown. Apelidos têm sempre algo de injusto, mesmo os menos cruéis.

Hallal vem clamando há semanas por um lockdown radical de três semanas no Rio Grande do Sul, certamente não por ideologia.

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Ele viu pela pesquisa a progressão do problema. E, por ter visto, ou a defender a redução da pressão sobre o sistema de saúde, para que pudesse respirar.

Creio que seria o caso de nos perguntarmos: Afinal, para que serve mesmo uma pesquisa como a que a UFPel tem feito?

Ao defender o fechamento, os pesquisadores cumprem um papel para o qual existem: pesquisar, informar, alertar dos riscos, recomendar.

Talvez não tivessem recomendado lockdown se o sistema de saúde houvesse ampliado a capacidade. Como não aconteceu, a saída lógica é recomendar medidas restritivas, como fizeram, em nota pública, ontem.

Ainda assim, não deixei de perceber, na nota, que até os acadêmicos já amenizam as palavras.

A UFPel já não fala explicitamente em lockdown, falam em 21 dias de distanciamento na faixa dos 70%. É um recuo, não apenas de forma, mas de essência. Porque, até outro dia, o reitor falava em lockdown – severo.

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Talvez se tenham dado conta de que não adianta insistir numa tese que não vai vingar, porque, afinal, estamos no Brasil. No fundo, a falta de educação, nosso eterno drama, é a grande responsável pela nossa miséria.

Preocupações políticas, eleitorais, de iniciativa privada são legítimas, sobretudo a dos últimos, que fazem a economia girar, produzem renda e emprego. O problema é que, numa emergência como a que estamos atravessando, quando olhamos os números, nenhum argumento contra as restrições consegue parar muito tempo em pé.

Nesta altura, com 90% dos 31 leitos de UTI para adultos com covid ocupados, e apenas 5 leitos esperando crianças com complicações, sabemos que fracassamos em tudo, na preparação do sistema de saúde, no distanciamento social, na fiscalização das aglomerações.

As leis de multa não tiveram efeito inibidor. Pelas fotos de movimentações na rua, há qualquer coisa de destrutivo no ar, de descompromisso com a vida do outro, até com a própria.

Ontem a prefeitura divulgou que o contágio cresceu entre os comerciários, segmento mais infectado. Aparentemente o distanciamento mínimo precisaria ser aumentado nas lojas, quando voltarem a ser abertas.

É tão surreal o que estamos vivendo que não duvido, daqui a pouco, ver clientes e atendentes se comunicando um pouco aos gritos, reando dinheiro e mercadorias por arremessos.

Ao anunciar que não recorrerá da bandeira vermelha, em que Pelotas foi classificada pelo estado, prefeita Paula disse, nesta sexta-feira (31), que “Pelotas decide não recorrer (…).

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Não foi Pelotas que decidiu, foi ela, assim como foi ela que decidiu não recorrer da bandeira laranja nesta semana anterior.

A elevação do status da decisão para a coletivo talvez sugira um sentimento de solidão e a busca, um pouco forçada, de divisão da responsabilidade.

Pode ter sido também uma forma de dizer que Pelotas e ela sejam uma coisa só. Não são. 

O caso é que, com a taxa atual de isolamento no mais baixo patamar de todo o período da pandemia, parece claro que a maioria da população chegou no ponto em que não pode seguir os protocolos, por uma simples questão de necessidade básica, o que chamam de “desobediência civil”.

Pelotas tem praticando a desobediência, essa é a verdade. A maioria vem pagando para ver o que o poder público fará caso requeiram internação, saúde, obrigação do estado, como prescreve a Constituição.

O Brasil é tão louco que até quem paga saúde privada não tem segurança 100%, como estamos vendo na pandemia, imagine o povão que busca o SUS.

Ainda ontem, a prefeita disse: “A nossa intenção é poder, na semana que vem, recuar (de bandeira e restrições), pedindo às pessoas para fazerem o isolamento social e nos ajudarem a superar, mais rápido, essa crise sanitária”.

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A vontade é de dizer: “Desista, é tarde”.

Não faz sentido falar em reabrir na semana que vem. Já está provado que as atuais medidas de isolamento e distanciamento não têm funcionado, imagina o que ocorrerá se flexibilizar mais. Às vezes dar esperança a quem não tem condições de superar-se é tão cruel quanto um apelido que estigmatiza.

O que poderia ter sido feito, não foi, nem pelo governo, nem pela população. A onda está engolfando a todos, resta saber quanto tempo demorará até quebrar na rebentação, e se não virá, atrás, outra onda.

Agora é tarde. Já devíamos estar familiarizados. No Brasil, sempre é.

Bom Bra-Pel.

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