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Cultura e entretenimento

Os verdadeiros heróis. Por Neiff Satte Alam

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Os heróis não são os que fazem grandes feitos, seja na pequena Vila Olimpo, em meados do século XX, ou em uma pandemia do início do séc. XXI, mas os que fazem do seu dia a dia um exemplo de superação e amor ao próximo, sem querer nada em troca e que nem mesmo esperam gratidão daqueles a quem voluntariamente estenderam a mão. Pois fazem ou fizeram o bem por uma ética entranhada em seu espírito e em seu cérebro.
…………..

Era uma tarde quente de um fevereiro típico, a maioria dos habitantes da Vila Olimpo estava em busca de se refrescarem nas águas do Rio Piratini ou do Rio Basílio (naqueles tempos antigos era chamado de Rio Santa Maria).

Em uma rua poeirenta, com boa parte revestida de carvão que sobrava sobre os trilhos da Via Férrea, que cruzava o vilarejo e era, então, depositado no leito da rua, “melhor que o barro”, diziam as pessoas, pois bem por ali circulava uma carroça colonial, com suas quatro rodas de madeira e puxada por dois cavalos que, aparentemente cansados da viagem, iam o a o.

Quatro pessoas, um casal de meia-idade, mas parecendo mais velhos, e duas crianças, que brincavam junto a sacos de milho verde, abóboras, laranjas e uma gaiola com duas galinhas. O pai das crianças tinha o rosto inchado em um dos lados, a ponto de não se ver o olho, tal o estado em que se encontrava a infecção em um, ou mais, dentes.

O endereço era o do Dentista da localidade que tinha seu consultório nesta rua. Pararam a carroça em frente à casa, bateram palmas na porteira de entrada do pequeno jardim, de onde podia se ler o letreiro: Dr. Pedro Brizzolara de Souza – Cirurgião Dentista.

Recebidos pelo próprio Dr. Pedro, como era conhecido por toda a comunidade de Vila Olimpo, as crianças e a mulher do homem ficaram a cargo da esposa do Dentista, carinhosamente chamada de Béia, mas no Grupo Escolar era Professora Arabella – orgulho-me de dizer que foram meus padrinhos. Um refresco e fatias de bolo eram servidos às crianças e sua mãe. Naquela época era assim, não estranhem, cidadania era algo respeitado por todos, não havia nenhum tipo de discriminação, e estas atitudes eram absolutamente naturais.

Depois de ser tratado, o homem, já aliviado de seu sofrimento – diz-se que a dor de dente é tão íntima que só a vítima reconhece, com um sorriso torto, pois a anestesia ainda estava a fazer efeito, perguntou ao dentista “quanto custou o tratamento, pois estava em dificuldade financeira. A resposta veio rápida, “nada”!

Este quadro foi pintado por Neiff e está na Escola Estadual Pedro Brizolara de Souza, em Pedro Osório

O homem pegou os filhos, a mulher, foi até a carroça, juntou algumas hortaliças, as duas galinhas, retornou ao consultório, grossas lágrimas, de um homem não acostumado a chorar, era a evidência física de um agradecimento emudecido pela dificuldade pronunciar palavras, entregou-as à Béia, retornou à carroça e seguiu seu caminho. As crianças, alheias a todo o drama de seu pai, instintivamente se viraram e, com um sorriso que só os inocentes têm, abanaram e atiraram beijos ao casal, que ainda estava junto ao portão…

Um dia me perguntaram “por que há uma escola em Pedro Osório com o nome de Escola Estadual Pedro Brizzolara de Souza?”

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Respondi: “Uma homenagem a um herói, que soube praticar cidadania, sem pedir nada em troca, a não ser o sorriso das crianças”!

Os verdadeiros heróis são os que habitam nossos corações, muitas vezes anônimos, mas inesquecíveis àqueles para quem fez o bem.

© Neiff Satte Alam é professor Universitário Aposentado – UFPEL Biólogo e Especialista em Informática na Educação

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Brasil e mundo

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento

O perigo das Gagas da vida

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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