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Cultura e entretenimento

O terror psicológico de O Farol

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No início do século XX, Thomas Wake (Willem Dafoe) é o responsável pelo farol de uma ilha isolada. Ele contrata Ephraim Winslow (Robert Pattinson) para substituir o ajudante anterior e colaborar nas tarefas diárias. Enquanto o veterano e o novato se conhecem, não demora muito para que a diferença de hierarquia, o isolamento e o tédio afetem a cabeça da dupla.

O Farol conta com a direção do competente Robert Eggers, o mesmo do fantástico A Bruxa, um dos melhores filmes de terror dos últimos anos. O diretor continua explorando os simbolismos e os aspectos mitológicos, só que desta vez de forma mais tensa e claustrofóbica. Eggers se junta a Jordan Peele, de Corra! e Nós e Ari Aster, de Hereditário e do recente Midsommar, como um dos diretores mais promissores do gênero.

Com o roteiro escrito ao lado do irmão Max, Robert Eggers constrói uma narrativa teoricamente simples, abordando a dinâmica e o relacionamento entre dois homens vivendo em condições adversas sob o efeito do isolamento. Vemos, então, um terror psicológico crescente, visto que a convivência atinge níveis cada vez maiores de intensidade e insanidade. Desta forma, é acertada a opção por um ritmo mais lento e que mostra toda a frustração de Winslow, que sofre com tarefas e responsabilidades, com a precariedade do local e as várias manias e hábitos de Wake, que dorme o dia todo e a as noites na torre do farol.

Em um filme com apenas dois personagens em 1h50 de duração, as melhores sequências do filme são da interação entre os dois protagonistas, brilhantemente interpretados por Willem Dafoe e Robert Pattinson. O primeiro vive o típico capitão bêbado e agressivo, que faz do farol a experiência da sua vida, enquanto que o segundo é o jovem explorado pelo chefe, ainda que esconda alguns segredos e possua um comportamento, no mínimo, instável.

https://youtu.be/aJoGdiyvdYs

Visualmente deslumbrante, o filme foi inteiramente filmado em preto e branco, com uma câmera de 35 mm que remete ao cinema antigo. A proporção é de 1.19:1, ou seja, com a tela quadrada, que literalmente encurrala os personagens e aumenta a sensação de aprisionamento. Com uma fotografia impecável, o filme é tecnicamente perfeito.

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Em termos de terror, o longa oferece cenas chocantes, em que mais uma vez os animais desempenham um papel importante. Narrativamente, a natureza surge como mais um personagem, afinal, as ondas do mar, a chuva, o vento e, claro, as gaivotas, possuem um grande impacto visual e sonoro.

Com um final impactante e traumatizante, O Farol reafirma o talento de Robert Eggers como um dos grandes nomes do gênero. Com um alto nível de qualidade técnica e artística, é uma obra de vários significados.

© Déborah Schmidt é formada em istração e servidora.

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Déborah Schmidt é servidora pública formada em istração/UFPel, amante da sétima arte e da boa música.

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Brasil e mundo

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento

O perigo das Gagas da vida

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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