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Opinião

Juremir Machado: A greve do magistério é justa e vigorosa

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ERS republicou nas redes sociais o artigo abaixo, assinado pelo jornalista e escritor Juremir Machado da Silva, no Correio do Povo de hoje:

“Todo dia, quando o sol se põe, eu penso nos professores que trabalham nas escolas estaduais do Rio Grande do Sul e sinto meu coração disparar. Eu penso nessas mulheres e homens que ganham pouco, trabalham muito, enfrentam dificuldades enormes e são chamados por levianos e insensatos de privilegiados. Penso no massacre que o pacote de reformas do governo pretende consumar e me sinto devastado pela impotência. Que posso fazer? Penso nesses funcionários públicos recebendo salários atrasados há 50 meses, esses aposentados que contam os dias, as horas, os pilas e escondem o rosto para não chorar.

Todo dia, quando o sol de põe, como no poema de Kerouac, eu penso em nossa gente e me digo na solidão da janela para a avenida engarrafada: nada mais legítimo do que esta greve do magistério. Fiz o dever de casa, li as propostas do governo, estudei as críticas feitas a elas, ouvi deputados, concluí que as perdas para os professores ao longo da carreira são acachapantes. Ao final, um professor ganhará R$ 3.800,00. É muito pouco para quem tem a mais nobre missão. Mais triste ainda é ver o projeto ser apresentado como um ganho para o magistério.

Eu penso nos pais e alunos que, neste mês de dezembro, sonham com a conclusão do ano escolar e com as férias e me pego balbuciando: compreendam. Eu mesmo não compreendo, porém, uma coisa: por que o governo não vem para o debate público com os professores? Por que não manda seus secretários exporem-se ao contraditório enfrentando, por exemplo, o ers? Todo dia, quando o sol se põe, eu me vejo repetindo: é muito fácil fazer planilhas e adotar estratégias que evitam o debate preferindo as articulações de bastidores e as manobras parlamentares. Não direi que é covardia por não me permitir uma palavra grosseira em relação ao governo de um jovem elegante como Eduardo Leite. Direi que é uma escolha errada, triste, injusta e inepta. Se debatesse, talvez o próprio governo pudesse compreender o tamanho do estrago que fará.

O Natal aproxima-se, eu penso, quando o sol se põe, na insegurança de todos esses mestres que perderão parte do pouco que ganham. Triênios e quinquênios não são privilégios, mas formas encontradas para melhorar ao longo do tempo remunerações insuficientes. Enquanto magistrados, procuradores, funcionários da Fazenda e outros nababos ganharem muito por não serem tantos quanto os professores e os policiais, eu direi ao crepúsculo: sociedade injusta, incompetente, incapaz de encontrar soluções inteligentes para os seus problemas, refém de empresas poderosas que não querem pagar seus impostos e vivem de incentivos imorais amealhados sob chantagem.

Todo dia quando o sol se põe eu penso na tal lei Kandir, aquela que tendo prometido ressarcimento às unidades federativas nunca o fez plenamente. A União beneficia-se com as exportações. Os Estados, que ficam sem o ICMS, ganham o quê? A noite cai enquanto eu me digo sem medo da grandiloquência típica da solidão: retire o projeto, governador, dê paz aos professores neste final de ano, receba os seus representantes, envie seus secretários para debates, promova a discussão, construa uma reforma que possa ser aceita por todos.”

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Brasil e mundo

Antes de Gaga, Madonna já havia aprontado no Rio

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Em seu show no Rio, em maio de 2024, Madonna exibiu numa tela ao fundo do palco imagens de ícones culturais, entre eles Che Guevara e Frida Kahlo. Foi surpreendente que o tenha feito, afinal, ela se apresenta como defensora dos direitos das minorias, inclusive da Queer, como faz Gaga, minoria que se fez maioria em ambos os shows.

Na ocasião, Madonna soou mais inconsequente que Gaga com seu “Manifesto do Caos”.

Os livros contam que o governo cubano, do qual Che fez parte, perseguia homossexuais, chegando a fuzilá-los por isso. Por quê? Porque os considerava hedonistas — indivíduos de natureza subversiva ao regime de exceção. Por serem, para eles, incapazes de controlar seus ardores sensuais e, por conseguinte, de se enquadrar em um regime em que a liberdade não tinha lugar, muito menos de fala.

Já Frida foi amante de Trotsky. E, depois deste ser assassinado no exílio a mando de Stálin, a artista ainda teve a pachorra de pintar um quadro com o rosto de Stálin, exposto até hoje em sua casa-museu, para iração de boquiabertos turistas bem informados sobre os fatos.

Madonna levou R$ 17 milhões do sistema capitalista por um show de um par de horas em que, literalmente, performou. Sem esforço, fingiu que cantava. Playback.

Dizem que artistas, por natureza, são “ingovernáveis”. A visão que eles teriam de vida seria mais importante do que a vida, do que a matéria. Pois há artistas e artistas.

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Madonna é dessas sumidades que a gente não sabe, de fato, o que pensa. Apenas intui, por projeção. Tente lembrar de alguma fala substancial dela. Não lembramos, porque vive da imagem que criou. Vende uma imagem que, no fundo, talvez nem corresponda ao que ela é de verdade.

No fim da trajetória, depois de ganhar a vida, artistas costumam surpreender o público, mostrando sua verdadeira face em biografias. Pelo desconforto de partir com uma máscara mortuária falsa.

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Cultura e entretenimento

O perigo das Gagas da vida

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Ajoelhado na calçada, à moda dos muçulmanos voltados para Meca, porém usando minissaia e rumorosos saltos vermelhos, um homem vestido de mulher berrava com desespero, na tarde de sexta 2, para uma janela vazia do Copacabana Palace, no Rio. Esgarçando-se na reiteração, expelia em golfos: “Aparece, Gagaaa. Gaaaagaaaaa”. Projetava-se à frente ao gritar, recuava em busca de fôlego e voltava a projetar-se.

Como a cantora não deu os ares à janela do hotel, o rapaz, tal qual uma atriz de novela mexicana, a sombra e o rímel escorrendo pelas bochechas, chorou o que pode. Estava cercado por uma multidão que, assim como ele, queria porque queria fincar os olhos na mutante Lady Gaga, uma mistura de mil faces a partir da fusão de Madonna com Maria Alcina, antes de seu show. No país que ama debochar, a cena viralizou.

Multidão muito maior ironizou o drama. Memes correram por todo lado para denunciar o grande número de desempregados no Brasil. Gente com tempo de sobra para chorar, porém pelas razões erradas.

Ocorre que muitos dos presentes à manifestação, como o atormentado rapaz, veem em Gaga um ícone Queer. Uma rainha da comunidade LGBTQIA+, representante global das causas do amor sem distinção, como a pop estimula em seu “Manifesto do Caos”, lido por ela no show. Nele, Gaga prega a “importância da expressão inabalável da própria identidade, mesmo que isso signifique viver em estado de caos interno”. Um manifesto assim, mais do que inconsequente, é temerário.

Como assim caos interior?

Tomado ao pé da letra por destinatários confusos, um manifesto desses pode ser mortificante. Afinal, viver a própria identidade não significa viver sem freios, mas sim encontrar um meio termo entre o desejo e a realidade. Justamente para evitar o caos. Logo, o manifesto é, isso sim, assustador — por haver (sempre há) tantas pessoas suscetíveis de embarcar nessas canoas de alto risco, cheias de remendos destinados a cobrir furos da embarcação. Pobres dos ageiros que, cegos por influência de ídolos de ocasião, avançam pelo lago em condições tão incertas.

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A idolatria… ela é mais antiga do que fazer pipi pra frente e, ao menos no caso dos homens, ainda de pé. Ultimamente as coisas andam um tanto confusas nesse quesito, mas ao menos a adoração se mantém intacta, assim como a veneta dos gozadores, para quem o humor repõe as coisas em proporção, ou seja, em seu devido lugar.

Todos temos cotas de iração por artistas, mas à veneração, eis a questão, se entregam os vulneráveis. O que esses buscam, mais do que a própria vida, é um reflexo (uma sombra?) de suas identidades. Uma projeção material da pessoa que gostariam de ser, não fossem o que são. É aí que mora, num duplex de cobertura, o perigo. O rapaz pensa que Gaga é como ele, só que não.

Não lembro quem disse que aqui é um vale de lágrimas. Mas o é de fato, bem como é um fato que artistas, como políticos, são depositários das nossas esperanças, mesmo que atuem na mais antiga das profissões, anterior à prostituição — a representação —, o primeiro requisito para sobreviver em sociedade, quando não ficar rico, e sem necessariamente excluir, ainda que camuflada, a segunda profissão.

É de se imaginar o rapaz voltando para casa frustrado. É de presumi-lo no sofá, fazendo um minuto de silêncio.

Mas depois se reerguendo.

Não há de ser nada. Amanhã Gaga vai arrasaaar.

Gagaaaaaa.

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