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Salvador Mallo (Antonio Banderas) é um melancólico cineasta em declínio que se vê obrigado a pensar sobre as escolhas que fez na vida quando seu ado retorna. Entre as lembranças de sua infância ao lado mãe (Penélope Cruz) e o reencontro com um antigo amor (Leonardo Sbaraglia), ele reflete sua relação com a escrita e com o cinema.
Cineasta de sucesso no ado, Salvador vive agora um período de incertezas, dores físicas e solidão, porém sai do isolamento para comemorar o aniversário de um dos seus filmes mais celebrados, o que o leva também ao reencontro com o ator do filme (Asier Etxeandia), com quem rompera há muito tempo.
Ao anunciar as filmagens de Dor e Glória, Pedro Almodóvar afirmou que este é o seu projeto mais pessoal. E não é difícil descobrir o porquê. Afinal, o drama constitui uma evidente autobiografia do diretor e roteirista, ao mostrar um cineasta homossexual em fim de carreira, que fez parte de uma banda punk e dirigiu comédias no início de sua caminhada artística. Salvador Mallo é, de fato, um alter-ego de seu criador.
Recheado de flashbacks, ainda que dispostos de forma não linear, o filme retorna à infância do protagonista para explorar sua relação com a mãe, a paixão pelas artes e a descoberta da homossexualidade. Vale destacar que a mãe é vivida por duas atrizes icônicas de Almodóvar: Penélope Cruz, na juventude, e Julieta Serrano, quando idosa.
Para os fãs de Almódovar, assim como eu, ressalto que sua estética continua impecável. Cores intensas dominam a trama, seja nos cenários e nos figurinos, repletos de texturas e estampas. Simples no estilo, mas ambicioso em seu discurso, a narrativa questiona o cinema ao mostrar que o tempo age de maneira impiedosa.
O filme é uma volta ao melodrama, um gênero que o espanhol definitivamente domina, e que a maturidade o tornou ainda mais perspicaz.
Dor e Glória dialoga com os magníficos Fale com Ela eTudo Sobre Minha Mãe ao explorar o ponto de vista de um protagonista masculino.
Em um dos melhores trabalhos de sua carreira, Antonio Banderas capricha ao recriar Almodóvar, das roupas até o cabelo arrepiado, em uma interpretação contida que realmente comove, especialmente no encontro entre Salvador e Federico, interpretado de forma emocionante por Leonardo Sbaraglia. Méritos também para a vibrante performance de Asier Etxeandia, que vive o ator Alberto Crespo, que ficou décadas brigado com Salvador.
Com uma abordagem sensível ao tratar de questões densas, Dor e Glória atravessa o ado de seu protagonista em tristezas, mágoas e saudades de forma delicada e simples. Com a trilha sonora de Alberto Iglesias e um final em aberto, o filme é uma homenagem aos amores e remorsos da vida artística através do olhar de ninguém menos que Pedro Almodóvar. Imperdível!