2e5h4t
Nada demove uma mãe de sua luta, quando ela está convicta de que está fazendo o melhor para seus filhos. Nada consome mais uma mãe do que a dúvida se ela está fazendo o certo, nas situações mais difíceis de decidir sobre como lidar com eles. É o caso, por exemplo, de uma mãe às voltas com filho usando drogas, como impor limites, quando as mães estão mais preparadas para proteger, do que para impor sanções em casa, ou permitir que o filho e por privações para aprender?
Há inúmeras situações mais sutis, diárias, em que as mães têm de decidir entre a tolerância ou o limite, o apoio ou a crítica, a orientação ou a aprovação. O que pesa é a responsabilidade de ter de tomar essas pequenas decisões a cada instante, se sentindo responsáveis. Um dos primeiros dilemas inclui o grau de apego aos filhos, apego esse que é natural e instintivo – estimulado pelos próprios hormônios, desde a gestação. A proteção, que é essencial para os bebês, pode se transformar em superproteção na infância, caso não haja um gradual desapego e um reconhecimento da necessidade de gradativa aquisição de autonomia pelo indivíduo em crescimento.
No Brasil atual – não sei a situação no resto do mundo, mas aqui é evidente – a quantidade de famílias “uniparentais” é imensa, ou seja, filhos criados só pelas mães, sem a presença dos pais. Isso representa uma dupla perda para as crianças, material e afetiva, com perda de apoio financeiro e afetivo desde a infância, acrescido do trauma do sentimento de rejeição. A omissão paterna é um triste fenômeno cultural, no qual muitos desses pais dão assistência a outros filhos, de seu próximo relacionamento, mas abandonam os próprios filhos. Essa omissão é agravada, às vezes, pela própria genitora quando essa (por mágoa, ou orgulho) se recusa a permitir a participação dos pais, após a separação, na criação das crianças.
Um fenômeno novo, que se contrapõe à tradicional omissão paterna, é o crescente número de pais que recorrem à Justiça para disputas de guarda ou ao menos garantir o direito de visitação aos filhos. O rompimento da tradição cultural de omissão paterna e superproteção materna é essencial a um desenvolvimento mais sadio dos nossos jovens, no qual ambos os genitores tem um papel a desempenhar.
O novo dilema das mães brasileiras, agora, é o desapego, a renúncia à superproteção e a separação entre as mágoas conjugais e as funções parentais (materna e paterna), ou seja, de permitir que seus “maus maridos” possam ser pais mais presentes do que ausentes. Nada mais atual que a metáfora do Rei Salomão, que ameaça dividir ao meio uma criança disputada por duas mães, quando uma abre mão da disputa para que a mesma não seja partida ao meio. Essa é a mãe mais amorosa, a capaz de desapego por amor. Nenhum amor é mais sublime que o desapegado.
⊗
Montserrat Martins é médico psiquiatra, autor de Em busca da Alma do Brasil
Facebook do autor | E-mail: montserrat@tjrs.jus.br